segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

A Caridade

Chico Xavier autografando.

A Caridade
PELO ESPÍRITO SÃO VICENTE DE PAULO
(Sociedade de Estudos Espíritas, sessão de 8 de junho de 1858)



Após comunicação do espírito de São Vicente de Paulo, sobre a Caridade, perguntou-se:
Permitiríeis que formulássemos algumas perguntas complementares a respeito do que acabastes de dizer?

Resp. – Eu o desejo muito; meu objetivo é vos esclarecer; perguntai o que quiserdes.

1. Pode-se entender a caridade de duas maneiras: a esmola propriamente dita e o amor aos semelhantes. Quando dissestes que era necessário que o coração se abrisse à súplica do infeliz que nos estendesse a mão, sem questionarmos se não seria fingida a sua miséria, não quisestes falar da caridade do ponto de vista da esmola?

Resp. – Sim; somente nesse parágrafo.

2. Dissestes que era preciso deixar à justiça de Deus a apreciação da falsa miséria. Parece-nos, entretanto, que dar sem discernimento às pessoas que não têm necessidade, ou que poderiam ganhar a vida num trabalho honesto, será estimular o vício e a preguiça. Se os preguiçosos encontrassem aberta com muita facilidade a bolsa dos outros, multiplicar-se-iam ao infinito, em
prejuízo dos verdadeiros infelizes.

Resp. – Podeis discernir os que podem trabalhar e, então, a caridade vos obriga a fazer tudo para lhes proporcionar trabalho; entretanto, também existem falsos pobres, capazes de simular com habilidade misérias que não possuem; é para os tais que se deve deixar a Deus toda a justiça.

3. Aquele que não pode dar senão um centavo, e que deve escolher entre dois infelizes que lhe pedem, não tem razão de inquirir quem, de fato, tem mais necessidade, ou deve dar sem exame ao primeiro que aparecer?

Resp. – Deve dar ao que pareça sofrer mais.

4. Não se deve considerar também como fazendo parte da caridade o modo por que é feita?

Resp. – É sobretudo na maneira de fazer a caridade que está o seu maior mérito; a bondade é sempre o indício de uma bela alma.

5. Que tipo de mérito concedeis àqueles a quem chamamos de benfeitores de ocasião?

Resp. – Só fazem o bem pela metade. Seus benefícios não lhes aproveitam.

6. Disse Jesus: “Que vossa mão direita não saiba o que faz vossa mão esquerda.” Têm algum mérito aqueles que dão por ostentação?

Resp. – Apenas o mérito do orgulho, pelo que serão punidos.

7. Em sua acepção mais abrangente, a caridade cristã não compreende igualmente a doçura, a benevolência e a indulgência para com as fraquezas dos outros?

Resp. – Imitai Jesus; ele vos disse tudo isso. Escutai-o mais que nunca.
N. do T.: Vide questão 886, de O Livro dos Espíritos.

8. A caridade é bem compreendida quando praticada exclusivamente entre pessoas que professam a mesma opinião ou pertencem a um mesmo partido?

Resp. – Não. É sobretudo o espírito de seita e de partido que se deve abolir, porquanto todos os homens são irmãos. É sobre essa questão que concentramos os nossos esforços.

9. Suponhamos que alguém vê dois homens em perigo, mas não pode salvar senão um. Qual dos dois deverá salvar, considerando-se que um deles é seu amigo e o outro é seu inimigo?

Resp. – Deve salvar o amigo, pois este amigo poderia acusá-lo de não gostar dele; quanto ao outro, Deus se encarregará.

 
A G O S T O D E 1 8 5 8
R E V I S T A E S P Í R I T A
ALLAN KARDEC


domingo, 27 de fevereiro de 2011

DEUS


Deus

Casimiro de Abreu (1839-1860)



Eu me lembro! Eu me lembro! - Era pequeno


E brincava na praia; o mar bramia,


E, erguendo o dorso altivo, sacudia,


A branca espuma para o céu sereno.










E eu disse a minha mãe nesse momento:


"Que dura orquestra! Que furor insano!


Que pode haver de maior do que o oceano


Ou que seja mais forte do que o vento?"










Minha mãe a sorrir, olhou pros céus


E respondeu: - "Um ser que nós não vemos,


É maior do que o mar que nós tememos,


Mais forte que o tufão, meu filho, é - Deus".









sábado, 26 de fevereiro de 2011

REVISTA ESPÍRITA, de ALLAN KARDEC

ALLAN KARDEC

Correspondência



Bruxelas, 15 de junho de 1858.

Meu caro Senhor Kardec:



Recebo e leio com avidez vossa Revista Espírita e recomendo aos meus amigos não a sua simples leitura, mas o estudo aprofundado do vosso O Livro dos Espíritos. Lamento bastante que minhas preocupações físicas não me deixem tempo para os estudos metafísicos, embora os tenha levado bastante longe para pressentir quanto estais perto da verdade absoluta, sobretudo quando vejo a coincidência perfeita que existe entre as respostas que me foram dadas e as vossas. Mesmo aqueles que vos atribuem pessoalmente a autoria de vossos escritos estão estupefatos pela profundidade e pela lógica que encerram. Repentinamente e de um salto, vós vos elevastes até ao nível de Sócrates e Platão, pela moral e pela filosofia estética; quanto a mim, conhecedor do fenômeno e da vossa lealdade, não duvido da exatidão das explicações que vos são dadas e abjuro todas as idéias que a esse respeito publiquei, enquanto nelas não pensava ver, juntamente com o Sr. Babinet, mais que fenômenos físicos ou charlatanice indigna da atenção dos sábios.

Como eu, não desanimeis diante da indiferença de vossos contemporâneos; o que está escrito, está escrito; o que está semeado germinará. A idéia de que a vida é uma afinação das almas, uma prova e uma expiação, é grande, consoladora, progressiva e natural.

Os que a ela aderem são felizes em todas as posições; em vez de se queixarem dos sofrimentos físicos e morais que os oprimem, devem regozijar-se ou, pelo menos, suportá-los com resignação cristã.

Espero passar brevemente em Paris, onde tenho muitos amigos a ver e bastantes coisas a fazer; deixarei tudo de lado, porém, na expectativa de vos poder levar um aperto de mão.



Jobard,

Diretor do Museu Real da Indústria.



R E V I S T A E S P Í R I T A
J U L H O D E 1 8 5 8



Bruxelas, 22 de junho de 1858.

Meu caro colega,



Com perífrases espirituosas, perguntais se eu ousaria confessar publicamente minha crença nos Espíritos e no perispírito, em vos autorizar a publicação de minhas cartas e em aceitar o título de correspondente da Academia de Espiritismo que fundastes, o que significaria, como se costuma dizer, ter coragem de sustentar a própria opinião.

Confesso que me sinto um pouco humilhado, ao ver que empregais as mesmas fórmulas e o mesmo discurso comumente dirigidos às pessoas simplórias, quando devíeis saber que toda a minha vida foi consagrada à sustentação da verdade e ao testemunho em seu favor, sempre que a encontrava, tanto na Física, quanto na Metafísica. Sei perfeitamente que o papel do adepto das idéias novas nem sempre está livre de inconvenientes, até mesmo neste século de luzes, e que podemos ser ridicularizados se dissermos que a luz se fará em pleno dia; no mínimo, seremos tachados de loucos; porém, como a Terra gira e o Sol haverá de brilhar para todos, faz-se necessário que os incrédulos se dobrem à evidência. É natural também que a existência dos Espíritos seja negada por aqueles que só acreditam no que vêem, do mesmo modo que a luz não existe para quantos se achem privados de seus raios. Podemos entrar em comunicação com eles? Eis aí toda a questão. Vede e observai.

O tolo nega sempre o que ele não entende;

Mesmo o maravilhoso é-lhe pobre vergel;

Ele não sabe nada, e nada quer ou aprende;

– Do incrédulo esse é, pois, um retrato fiel.



Disse a mim mesmo: Evidentemente o homem é duplo, visto que a morte o desdobra; quando uma metade permanece aqui, a outra vai para algum lugar, conservando a sua individualidade; o Espiritismo, portanto, está perfeitamente de acordo com as Escrituras, com o dogma, com a própria religião, que crê na existência dos Espíritos; e tanto isso é verdade que ela exorciza os maus e evoca os bons: o Vade retro e o Veni Creator dão prova disso. A evocação, portanto, é uma coisa séria e não uma obra diabólica, ou uma charlatanice, como pensam alguns.

Sou curioso, não nego, mas quero ver. Jamais me ouviram falar: Trazei-me o fenômeno. Em vez de o esperar tranqüilamente em minha poltrona, o que não faria o menor sentido, saí correndo à sua procura. A propósito do magnetismo, desenvolvi o seguinte raciocínio, e isso há mais de 40 anos: É impossível que homens tão apreciáveis dêem-se ao trabalho de escrever milhares de volumes para me fazerem crer na existência de uma coisa que não existe. Tentei em vão, durante muito tempo, obter aquilo que procurava; como perseverasse, acabei por ser muito bem recompensado, visto ter conseguido reproduzir todos os fenômenos de que ouvira falar; detive-me, depois, durante 15 anos. Com o aparecimento das mesas falantes, quis saber exatamente como as coisas se passavam; hoje surge o Espiritismo e a minha atitude é a mesma. Quando aparecer alguma coisa nova, correrei atrás dela com o mesmo ardor com que me coloco à frente das descobertas modernas de todos os gêneros. É a curiosidade que me arrasta, e lamento que os selvagens não sejam curiosos: por isso mesmo continuam selvagens. A curiosidade é a mãe da instrução. Sei perfeitamente que essa ânsia de aprender tem me prejudicado bastante, e que se me tivesse mantido nessa respeitável mediocridade, que conduz às honras e à fortuna, teria aproveitado a melhor parte. Mas há muito tempo confessei a mim mesmo que me achava apenas de passagem nesta sórdida pousada, onde não vale a pena desfazer as malas. O que me faz suportar sem dor as injúrias, as injustiças, os roubos de que fui vítima privilegiada, foi a idéia de que aqui não existe nem felicidade, nem infelicidade com que possamos nos alegrar ou nos afligir. Trabalhei, trabalhei, trabalhei, o que me deu forças para fustigar os adversários mais encarniçados e impor respeito aos demais, de sorte que agora sou mais feliz e mais tranqüilo do que as pessoas que me escamotearam uma herança de 20 milhões. Eu os lastimo, pois não lhes invejo a posição no mundo dos Espíritos. Se lamento essa fortuna não o é por mim – afinal de contas, não tenho apetite para digerir 20 milhões – mas pelo bem que deixei de fazer. Que alavanca poderosa, nas mãos de um homem que soubesse empregá-la utilmente! Quanto impulso poderia proporcionar à Ciência e ao progresso! Aqueles que têm fortuna ignoram, freqüentemente, as verdadeiras alegrias que se poderiam permitir. Sabeis o que falta à ciência espírita para propagar-se com rapidez? Um homem rico, que a ela consagrasse sua fortuna por puro devotamento, sem mescla de orgulho, nem de egoísmo, que fizesse as coisas em grande estilo, sem parcimônia, nem mesquinhez: tal homem faria a ciência avançar meio século.

Por que me foram subtraídos os meios de o fazer? Esse homem será encontrado; algo mo diz; honra a ele, pois!

Vi uma pessoa viva ser evocada; teve uma síncope até que seu Espírito retornasse. Poderíeis evocar o meu, para ver o que vos direi? Evocai também o Dr. Mure, morto no Cairo no dia 4 de junho; era um grande espiritista e médico homeopata. Perguntai-lhe se ainda acredita em gnomos. Certamente está em Júpiter, pois era um grande Espírito, mesmo aqui na Terra, um verdadeiro profeta a ensinar e meu melhor amigo. Estará contente com o artigo necrológico que lhe dediquei?

Isso está indo muito longe, direis; mas nem tudo são rosas em terdes a mim como correspondente. Vou ler vosso último livro, que acabo de receber; à primeira vista, não duvido que ele faça muito bem, ao destruir uma porção de preconceitos, pois soubestes mostrar o lado sério da coisa. O caso Badet é muito interessante; falaremos dele depois.

Todo vosso,

Jobard





Fonte: R E V I S T A E S P Í R I T A

J U L H O D E 1 8 5 8

Jornal de Estudos Psicológicos

Publicada sob a direção de ALLAN KARDEC



sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

SACUDIR O PÓ

Jesus bate a porta

SACUDIR O PÓ

“E se ninguém vos receber, nem escutar as vossas palavras, saindo daquela casa ou cidade, sacudi o pó de vossos pés.” — Jesus. (MATEUS, CAPÍTULO 10, VERSÍCULO 14.)

Os próprios discípulos materializaram o ensinamento de Jesus, sacudindo a poeira das sandálias, em se retirando desse ou daquele lugar de rebeldia ou impenitência. Todavia, se o símbolo que transparece da lição do Mestre estivesse destinado apenas a gesto mecânico, não teríamos nele senão um conjunto de palavras vazias.

O ensinamento, porém, é mais profundo. Recomenda a extinção do fermento doentio.

Sacudir o pó dos pés é não conservar qualquer mágoa ou qualquer detrito nas bases da vida, em face da ignorância e da perversidade que se manifestam no caminho de nossas experiências comuns.

Natural é o desejo de confiar a outrem as sementes da verdade e do bem, entretanto, se somos recebidos pela hostilidade do meio a que nos dirigimos, não é razoável nos mantenhamos em longas observações e apontamentos, que, ao invés de conduzir-nos a tarefa a êxito oportuno, estabelecem sombras e dificuldades em torno de nós.

Se alguém te não recebeu a boa-vontade, nem te percebeu a boa intenção, por que a perda de tempo em sentenças acusatórias? Tal atitude não soluciona os problemas espirituais. Ignoras, acaso, que o negador e o indiferente serão igualmente chamados pela morte do corpo à nossa pátria de origem?

Encomenda-os a Jesus com amor e prossegue, em linha reta, buscando os teus sagrados objetivos. Há muito por fazer na edificação espiritual do mundo e de ti mesmo. Sacode, pois, as más impressões e marcha alegremente.

PÃO NOSSO
FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER
DITADO PELO ESPÍRITO EMMANUEL

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

NA VISÃO DO MUNDO


NA VISÃO DO MUNDO




Emmanuel

Não diga que o mundo é perverso, quando é justamente do chão do mundo que se recolhe a bênção de pão.

O charco é uma queixa da gleba contra o descaso do lavrador.

Compara a Terra, à uma universidade e notarás que todo espírito encarnado é um aluno em formação.


Aquilo que plantares nos corações alheios é o que colherás nas manifestações dos outros.


Quem aplique lentes esfumaçadas nos olhos, não notará senão tristeza onde o mundo está ostentando as cores da esperança e da alegria.

A existência para cada um de nós é o que estivermos fazendo.


Cada pessoa vê no mundo a própria imagem.

A melhor crítica é aquela que se expressa mostrando como se deve fazer.


A utilidade é a força real que assegura a situação de cada um.


A proteção mais segura que possas desfrutar é a de teu próprio serviço.


Não perguntes além do necessário, para que os teus encargos não surjam atrasados.


De quando a quando, para efeito de valorização do tempo, relaciona quantas palavras terás pronunciado, no transcurso do dia, sem qualquer significação para o bem.


A sabedoria da vida te colocou no lugar onde possas aprender com eficiência e servir melhor.


Quando alguém condena o mundo, é porque se sente condenado em si mesmo.


O trabalho que executes é tua certidão de identidade do ponto de vista espiritual.


Faze e terás certamente aquilo que esperas seja feito.


O que estiveres realizando para os outros é justamente o que estarás realizando por ti mesmo.


As leis do mundo não se enganam: o que deres de ti, serte-á dado.


A Terra é a nossa escola benemérita: lembra-te de que o relógio não pára.

*

Do Livro “COMPANHEIRO” – PSICOGRAFIA: FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER











































quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

A dor serena


A dor serena



A experiência da dor é comum a todos os homens.

Ela se revela a cada um de modo diferente, mas a todos visita.

Os pobres sofrem pela incerteza quanto à manutenção de sua família.

Os doentes experimentam padecimento físico.

Os idealistas se angustiam pelo bem que tarda em se realizar.

O governante se acabrunha pela magnitude da tarefa que lhe repousa sobre os ombros.

Qualquer que seja a posição social de um homem, ele vive a experiência do sofrimento.

A própria transitoriedade da vida terrena é fonte de angústias e incertezas.

Pode-se muito fazer e muito angariar, mas a morte é uma certeza e a tudo transformará.

Alguma dilaceração é inerente ao viver.

Ninguém ignora a possibilidade de seus afetos o sucederem no retorno à Pátria Espiritual.

Nenhum homem sensato imagina que o vigor físico o acompanhará para sempre.

A universalidade da dor chama a atenção dos homens para o fato de que são essencialmente iguais.

Ocupam diferentes posições e têm experiências singulares, mas ninguém é feito de material imune à ação do tempo.

A vida material é transitória e isso não se pode negar.

Contudo, as pessoas evitam refletir sobre essa realidade.

Quando apanhadas pelos fenômenos próprios da transitoriedade da vida, costumam se revoltar.

Todos sofrem, mas poucos sofrem bem.

Tão raro é o bem sofrer que geralmente não é sequer compreendido.

Quando, em face de alguma experiência dilacerante, a criatura mantém a serenidade, acha-se que ela tem algum problema.

Confunde-se sensibilidade à dor com escândalos.

Se a pessoa não brada indignada e não procura culpados por sua miséria, entende-se que ela tem algo de obscuro em seu íntimo.

Uma mãe capaz de suportar serenamente a dor da morte de um filho surge aos olhos alheios como insensível.

Como se ausência de gritos significasse falta de amor!

No Sermão da Montanha, Jesus afirmou a bem-aventurança dos que choram, dos injuriados e perseguidos.

Certamente não estava a referir-Se aos que sofrem em meio a revoltas e desatinos.

Afinal, em outra passagem evangélica, afirmou que, quem desejasse, deveria tomar sua cruz e segui-Lo.

Trata-se de um sinal de que a conquista da redenção pressupõe algum sacrifício.

A Terra, por algum tempo ainda, será morada de Espíritos rebeldes às leis divinas.

Por séculos, semearam dor nos caminhos alheios e não se animaram a reparar os estragos.

Por isso, são periodicamente atingidos pelos reflexos de seus atos, até que aprendam o código de fraternidade que rege a Vida.

Reflita sobre isso antes de se permitir gritos e rebeldia.

As experiências que o atingem visam a torná-lo melhor e mais sensível à dor do semelhante.

Elas possibilitam sua recomposição perante a Justiça Cósmica.

Não perca a oportunidade com atitudes infantis.

Cesse reclamações, não procure culpados e não se imagine vítima.

Aproveite o ensejo para exemplificar sua condição de cristão.

Quando o sofrimento o atingir, sinta-se desafiado a ser um exemplo de dignidade, esforço e luta.

Sua serenidade perante a dor fará com que outros repensem a forma com que vivem.

Assim, você estará colaborando na construção de um mundo melhor, com menos revolta e insensatez.

Pense nisso.

Redação do Momento Espírita

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Escola da Bênção

Chico Xavier e livros

Escola da Bênção


 

Sofres cansaço da vida, dissabores domésticos, deserção de amigos, falta de alguém...
Por isso, acordaste sem paciência, tentando esquecer.
Procuraste espetáculos públicos que te não distraíram e usaste comprimidos repousantes que não te anestesiaram o coração.
Entretanto, para teu reconforto, pelo menos uma vez por semana, sai de ti mesmo e busca na caridade a escola da bênção.
Em cada compartimento aprenderás diversas lições ao contato daqueles que lêem na cartilha das dores que desconheces.
Surpreenderás o filme real da angústia no martírio silencioso dos que jazem num catre de espinhos, sem se queixarem, e a emocionante novela das mães sozinhas que ofertam, gemendo, aos filhinhos renascentes a concha do próprio seio como prato de lágrimas.
Fitarás homens tristes, suando penosamente por singela fatia de pão, como atletas perfeitos do sofrimento, e os que disputam valorosamente com os animais um lugar de repouso ao pé de ruínas em abandono.
Observarás, ainda mais, os paralíticos que sonham com a alegria de se arrastarem, os que se vestem de chagas esfogueantes, suplicando um momento de alívio, os que choram mutilações trazidas do berço e os que vacilam, desorientados, na noite total da loucura.
Ver-te-ás, então, consolado, estendendo consolo, e, ajustado a ti mesmo, volverás ao conforto da própria casa, murmurando, feliz:

Obrigado, meu Deus!

Meimei
Francisco Cândido Xavier





segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

Evangelizar os pequeninos é iluminar consciências.


A educadora Socorro Albuquerque ministra o XII Curso de Evangelizadores
do Alto Sertão da Paraíba, no NEAK, em Cajazeiras (PB).

Evangelizar os pequeninos é iluminar consciências.

“Encarnando, com o objetivo de se aperfeiçoar, o Espírito, durante esse período, é mais acessível às impressões que recebe, capazes de lhe auxiliarem o adiantamento, para o que devem contribuir aqueles incumbidos de educá-lo”

(O L.E., 383) A visão que se tem da criança pela ótica espírita difere fundamentalmente da que é sustentada pelas doutrinas que pregam a unicidade da existência corpórea. Para essas correntes de pensamento religioso, a criança traz, ao nascer, apenas os ascendentes biológicos, que seriam herdados dos antepassados, próximos ou remotos. A concepção espírita difere, também, de outras doutrinas reencarnacionistas que consideram a volta do Espírito ao mundo material apenas com fins punitivos ou, quando muito, para o cumprimento de uma missão.

O Espiritismo não nega a reencarnação missionária, e ensina que aquilo que é visto como punição é apenas o funcionamento da lei de causa e efeito. Entretanto, vai além, ampliando a compreensão da própria vida, ao revelar o aspecto evolutivo da reencarnação. Vista sob essa ótica, a criança é um Espírito imortal, detentor de imensa bagagem de experiências vivenciadas em outras épocas, herdeira de si mesma, que retorna à Terra a fim de adquirir novos conhecimentos e, principalmente, de reformular sua maneira de proceder, ajustando-a, tanto quanto possível, aos postulados do Evangelho de Jesus.

Assim, aprendemos, no Espiritismo, que reencarnamos para prosseguirmos a nossa jornada evolutiva. Ao responderem a Kardec a respeito da utilidade de passar pelo estado de infância, os Espíritos Superiores atribuíram a responsabilidade da execução dos procedimentos educativos, não só aos pais, mas a todos aqueles que têm oportunidade de propiciar à criança ensinamentos e exemplos que a ajudem a adquirir novos conhecimentos e a reformular seu modo de proceder, ou seja, de reeducar-se através do esforço consciente, no sentido de exteriorizar sua luz, herança divina de que todos os Espíritos somos dotados, conforme ensinamento de Jesus (Mt, 5: 16). Dentre esses “incumbidos de educá-lo”, conforme expressão dos Espíritos, estamos nós, evangelizadores da infância, ligados a esses irmãos recém-chegados do Mundo Espiritual, não pelos laços da consangüinidade nem do parentesco físico, mas pelos mais sagrados elos da nobre tarefa que assumimos perante o Evangelizador Maior.


Percíncula e Fernanda, duas gerações comprometidas com a
divulgação da Doutrina Espírita.

 Entendemos, assim, que fomos admitidos num trabalho que é continuação daquele iniciado no Mundo Espiritual, na preparação do Espírito para sua volta às lides terrenas. Ao considerarmos a Escola Espírita de Evangelização como um Posto Avançado do Mundo Espiritual, devemos meditar sobre a extensão e a responsabilidade da tarefa que nos é atribuída. Conscientes dessa grave responsabilidade, qual seja a de iluminar consciências, urge que nos preparemos convenientemente através da oração sincera, da meditação serena, do estudo edificante, a fim de que nossa palavra, portadora de carga magnética gerada na convicção profunda, e não apenas na informação superficial, possa tocar os pequeninos, pois quem não está convencido do que diz raramente consegue convencer alguém.

Como exemplo, é oportuna a lembrança das palavras do Benfeitor Alexandre, citadas no livro “Missionários da Luz”, à página 311: “O companheiro que ensina a virtude, vivendo-lhe a grandeza em si mesmo, tem o verbo carregado de magnetismo positivo, estabelecendo edificações espirituais nas almas que o ouvem. Sem essa característica, a doutrinação, quase sempre, é vã.” Desse modo, a palavra suave, embora firme, nos abrirá as portas do entendimento da criança, propiciando-nos oportunidade à semeadura das lições do Evangelho, agora explicado à luz da Doutrina Espírita. Devemos ter consciência de que a Escola Espírita de Evangelização – chamada afetivamente de “escolinha” – é, malgrado o pouco tempo de que dispomos para o convívio com a criança, apesar da incompreensão da maioria dos dirigentes de centros espíritas, e das dificuldades materiais, a escola que mais esclarece no mundo, aquela mais propícia à implantação dos tempos novos, face aos ensinamentos libertadores, capazes de levar o evangelizando a uma mudança de mentalidade, que o capacitará a colaborar efetivamente na implantação de uma sociedade mais justa, mais fraterna, dos tempos novos, conforme preconizam os Espíritos.


A Casa do Caminho de Sousa (PB)  foi muito bem representada
por Bruno, Flaviane e Bruna.

Importa seja lembrando também que o Espiritismo, ao trazer-nos de volta os ensinamentos de Jesus, na sua simplicidade, objetividade e pujança originais, tira-nos aquele sentimento místico do comparecimento ao templo – assim chamado casa de Deus – e nos revela o mundo como oficina da nossa vivência religiosa, portanto do nosso aperfeiçoamento. Tira-nos, também, outro referencial religioso, além do templo, qual seja a figura do sacerdote, do pastor, do guru. Tendo isso em mente, devemos meditar sobre o que representamos para a criança, que nos observa efetivamente como referencial religioso, embora nos empenhemos em mostrar-lhe as figuras veneráveis que, através dos tempos, têm trazido suas contribuições para a iluminação da criatura humana, no que se destaca a figura maior de Jesus.

Assim pensando, devemos nos empenhar, com toda a força do nosso entendimento, no sentido de nos aprimorarmos cada vez mais para a execução do nosso trabalho junto à criança. Esse aprimoramento envolve três aspectos principais, que devem ocupar o primeiro plano das preocupações do evangelizador: o pensar, o sentir e o fazer. O pensar nos leva à reflexão, à conscientização plena do valor do nosso trabalho.

 Quando meditamos sobre nossa atuação no setor de evangelização infantil, devemos avaliar o nível do nosso comprometimento com a tarefa; que espaço ela ocupa em nossa mente; quantas horas por semana dedicamos ao preparo da mensagem que levaremos à criança, que espera de nós a orientação a fim de que caminhe com segurança neste mundo tão conturbado em que vivemos.

Sem que nos julguemos grandes missionários ou Espíritos iluminados, é justo que tenhamos consciência da relevância e do valor da tarefa a que nos dispomos, ainda que a nossa turma de evangelizandos seja pequena, que seja “turma” de um só! E quando nos assalte dúvida a respeito da validade do nosso esforço, devemos nos lembrar de que no trabalho mediúnico de desobsessão – que deveria denominar-se “evangelização do desencarnado” – um grupo de várias pessoas se empenha, às vezes durante muito tempo, no encaminhamento de um único Espírito que trilha caminho equivocado, não raro por não ter sido evangelizado na infância.

 Ao serem examinados os resultados das tarefas desenvolvidas nas instituições espíritas, fica evidente que a Evangelização da criança é a atividade mais importante, de vez que beneficia o Espírito desde a fase infantil, influenciando seu proceder, dando-lhe diretrizes que o ajudarão não só nesta sua passagem pela Terra, mas que servirão como farol a iluminar-lhe a consciência em sua vida de Espírito imortal.

Por isso é que, embora reconhecendo o valor das outras tarefas desenvolvidas nos centros espíritas, chega-se facilmente à conclusão que a Evangelização da Criança deveria ter primazia, deveria ser atividade olhada com a maior responsabilidade por parte dos dirigentes das instituições espíritas, por ser a encaminhadora do Espírito, numa verdadeira continuação do trabalho iniciado no Mundo Espiritual, durante os preparativos para sua volta.

 É a consciência profunda do insubstituível valor da tarefa que nos deve alentar nos momentos de desânimo, quando a incompreensão dos dirigentes da casa onde trabalhamos, a falta de espaço físico, de material apropriado, a falta de cooperação dos próprios pais, as dificuldades com a criança, todas essas dificuldades quiserem nos tirar dessa seara bendita a que fomos convocados.

O Evangelizador deve empenhar-se, também, no desenvolvimento da sua capacidade de sentir. Todos temos em nós o amor, em estado de latência. Essa herança divina, que se revela através dos séculos sucessivos, pode ter sua exteriorização acelerada pelo esforço consciente da criatura. E o Evangelizador é desafiado ao esforço de amar, pois quem não ama não tem condição de suscitar nos pequeninos o desejo de amar.

O pensar é muito importante, imprescindível mesmo. Mas o pensar sem o sentir pode levar-nos a uma postura muito fria, muito calculada que, embora matematicamente certa dentro dos parâmetros meramente pedagógicos, vistos do ângulo acadêmico, não se coaduna com o espírito do trabalho de evangelização, que deve primar pelo incentivo ao desenvolvimento das virtudes preconizadas pelo Evangelho.

 Dentro dessa visão, o nosso fazer nos aponta o caminho do esforço na preparação das aulas, no que tange ao conteúdo a ser ministrado, ao material a ser usado, mas, principalmente, o caminho do esforço da preparação da nossa capacidade de sentir, de amar, iluminando-nos para que possamos iluminar consciências.

José Passini












Alguns Evangelizadores participantes do Evento  de 20.02.2011.com a brilhante
 educadora Socorro Albuquerque (De vestido), residente em Campina Grande.







domingo, 20 de fevereiro de 2011

AS MULHERES DO EVANGELHO

Airton Lunguinho, palestrante espírita, natural de Sousa (PB),
residente no Estado do Rio de Janeiro há mais de 40 anos.
Obreiro da Associação Espírita Jerônimo Ribeiro, realizou palestra na
Casa do Caminho com o tema Mulheres do Evangelho, em 19.02.2011.

AS MULHERES DO EVANGELHO - JOANA DE CUSA

Entre a multidão que invariavelmente acompanhava a Jesus nas pregações do ago, achava-se sempre uma mulher de rara dedicação e nobre caráter, das mais altamente colocadas na sociedade de Cafarnaum.

Tratava-se de Joana, consorte de Cusa, intendente de Ântipas, na cidade onde se conjugavam interesses vitais de comerciantes e de pescadores. Joana possuía verdadeira fé; contudo, não conseguiu forrar-se às amarguras domésticas, porque seu companheiro de lutas não aceitava as claridades do Evangelho.

Considerando seus dissabores íntimos, a nobre dama procurou o Messias, numa ocasião em que ele descansava em casa de Simão, e lhe expôs a longa série de suas contrariedades e padecimentos.


O esposo não tolerava a doutrina do Mestre. Alto funcionário de Herodes, em perene contacto com os representantes do Império, repartia as suas preferências religiosas, ora com os interesses da comunidade judaica, ora com os deuses romanos, o que lhe permitia viver em tranquilidade fácil e rendosa. Joana confessou ao Mestre os seus temores, suas lutas e desgostos no ambiente doméstico, expondo suas amarguras em face das divergências religiosas existentes entre ela e o companheiro.

Após ouvir-lhe a longa exposição, Jesus lhe ponderou:— Joana, só há um Deus, que é o Nosso Pai, e só existe uma fé para as nossas relações com o seu amor. Certas manifestações religiosas, no mundo, muitas vezez não passam de vícios populares nos hábitos exteriores. Todos os templos da Terra são de pedra; eu venho, em nome de Deus, abrir o templo da fé viva no coração dos homens. Entre o sincero discípulo do Evangelho e os erros milenários do mundo, começa a travar-se o combate sem sangue da redenção espiritual. Agradece ao Pai o haver-te julgado digna do bom trabalho, desde agora.

Teu esposo não te compreende a alma sensível? Compreender-te-à um dia. É leviano e indiferente? Ama-o, mesmo assim Não te acharias ligada a ele se não houvesse para isso razão justa. Servindo-o com amorosa dedicação, estarás cumprindo a vontade de Deus. Falas-me de teus receio: e de tuas dúvidas. Deves, pelo Evangelho, amá-lo ainda mais. Os sãos não precisam de médico. Além disso, não poderemos colher uvas nos abrolhos, mas podemos amanhar o solo que produziu cardos envenenados, a fim de cultivarmos nele mesmo a videira maravilhosa do amor e da vida.

Joana deixava entrever no brilho suave dos olhos a íntima satisfação que aqueles esclarecimentos lhe causavam; mas, patenteando todo o seu estado dalma, interrogou:— Mestre, vossa palavra me alivia o espírito atormentado; entretanto, sinto dificuldade extrema para um entendimento recíproco no ambiente do meu lar. Não julgais acertado que lute por impor os vossos princípios? Agindo assim, não estarei reformando o meu esposo para o céu e para o vosso reino? O Cristo sorriu serenamente e retrucou:

— Quem sentirá mais dificuldade em estender as mãos fraternas, será o que atingiu as margens seguras do conhecimento com o Pai, ou aquele que ainda se debate entre as ondas da ignorância ou da desolação, da inconstância ou da indolência do espírito? Quanto à imposição das idéias — continuou Jesus, acentuando a im-rortância de suas palavras —, por que motivo Deus não impõe a sua verdade e o seu amor aos tiranos da Terra? Por que não fulmina com um raio o conquistador desalmado que espalha a miséria e a destruição, com as forças sinistras da guerra?

A sabedoria celeste não extermina as paixões: transforma-as. Aquele que semeou o mundo de cadáveres desperta, às vezes, para Deus, apenas com uma lágrima. O Pai não impõe a reforma a seus filhos: esclarece-os no momento oportuno. Joana, o apostolado do Evangelho é o de colaboração com o céu, nos grandes princípios da redenção. Sê fiel a Deus, amando o teu companheiro do mundo, como se fora teu filho. Não percas tempo em discutir o que não seja razoável. Deus não trava contendas com as suas criaturas e trabalha em silêncio, por toda a Criação. Vai!...

Esforça-te também no silêncio e, quando convocada ao esclarecimento, fala o verbo doce ou enérgico da salvação, segundo as circunstâncias! Volta ao lar e ama o teu companheiro como material divino que o céu colocou em tuas mãos para que talhes uma obra de vida, sabedoria e amor!... Joana de Cusa experimentava um brando alívio no coração. Enviando a Jesus um olhar de carinhoso agradecimento, ainda lhe ouviu as últimas palavras:— Vai, filha!... Sê fiel!

Desde esse dia, memorável para a sua existência, a mulher de Cusa experimentou na alma a claridade constante de uma resignação sempre pronta ao bom trabalho e sempre ativa para a compreensão de Deus. Como se o ensinamento do Mestre estivesse agora gravado indelevelmente em sua alma, considerou que, antes de ser esposa na Terra, já era filha daquele Pai que, do Céu, lhe conhecia a generosidade e os sacrifícios. Seu espírito divisou em todos os labores uma luz sagrada e oculta. Procurou esquecer todas as características inferiores do companheiro, para observar somente o que possuía ele de bom, desenvolvendo, nas menores oportunidades, o embrião vacilante de suas virtudes eternas.

Mais tarde, o céu lhe enviou um filhinho, que veio duplicar os seus trabalhos; ela, porém, sem olvidar as recomendações de fidelidade que Jesus lhe havia feito, transformava suas dores num hino de triunfo silencioso em cada dia. Os anos passaram e o esforço perseverante lhe multiplicou os bens da fé, na marcha laboriosa do conhecimento e da vida. As perseguições políticas desabaram sobre a existência do seu companheiro. Joana, contudo, se mantinha firme. Torturado pelas idéias odiosas de vingança, pelas dívidas insolváveis, pelas vaidades feridas, pelas moléstias que lhe verminaram o corpo, o ex-intendente de Ântipas voltou ao plano espiritual, numa noite de sombras tempestuosas.

Sua esposa, todavia, suportou os dissabores mais amargos, fiel aos seus ideais divinos edificados na confiança sincera. Premida pelas necessidades mais duras, a nobre dama de Cafarnaum procurou trabalho para se manter com o filhinho que Deus lhe confiara. Algumas amigas lhe chamaram a atenção, tomadas de respeito humano. Joana, no entanto, buscou esclarecê-las, alegando que Jesus igualmente havia trabalhado, calejando as mãos nos serrotes de modesta carpintaria e que, submetendo-se ela a uma situação de subalternidade no mundo, se dedicara primeiramente ao Cristo, de quem se havia feito escrava devotada.

Cheia de alegria sincera, a viúva de Cusa esqueceu o conforto da nobreza material, dedicou-se aos filhos de outras mães, ocupou-se com os mais subalternos afazeres domésticos, para que seu filhinho tivesse pão. Mais tarde, quando a neve das experiências do mundo lhe alvejou os primeiros anéis da fronte, uma galera romana a conduzia em seu bojo, na qualidade de serva humilde. No ano 68, quando as perseguições ao Cristianismo iam intensas, vamos encontrar, num dos espetáculos sucessivos do circo, uma velha discípula do Senhor amarrada ao poste do martírio, ao lado de um homem novo, que era seu filho. Ante o vozerio do povo, foram ordenadas as primeiras flagelações.

— Abjura!... — exclama um executor das ordens imperiais, de olhar cruel e sombrio. A antiga discípula do Senhor contempla o céu, sem uma palavra de negação ou de queixa. Então o açoite vibra sobre o rapaz seminu, que exclama, entre lágrimas: — "Repudia a Jesus, minha mãe!... Não vês que nos perdemos?! Abjura!... por mim, que sou teu filho!..."Pela primeira vez, dos olhos da mártir corre a fonte abundante das lágrimas. As rogativas do filho são espadas de angústia que lhe retalham o coração.— Abjura!... Abjura!

Joana ouve aqueles gritos, recordando a existência inteira. O lar risonho e festivo, as horas de ventura, os desgostos domésticos, as emoções maternais, os fracassos do esposo, sua desesperação e sua morte, a viuvez, a desolação e as necessidades mais duras... Em seguida, ante os apelos desesperados do filhinho, recordou que Maria também fora mãe e, vendo o seu Jesus crucificado no madeiro da infâmia, soubera conformar-se com os desígnios divinos. Acima de todas as recordações, como alegria suprema de sua vida, pareceu-lhe ouvir ainda o Mestre, em casa de Pedro, a lhe dizer: —

"Vai filha! Sê fiel!" Então, possuída de força sobre-humana, a viúva de Cusa contemplou a primeira vítima ensanguentada e, fixando no jovem um olhar profundo e inexprimível, na sua dor e na sua ternura, exclamou firmemente:— Cala-te, meu filho! Jesus era puro e não desdenhou o sacrifício. Saibamos sofrer na hora dolorosa, porque, acima de todas as felicidades transitórias do mundo, é preciso ser fiel a Deus! A esse tempo, com os aplausos delirantes do povo, os verdugos lhe incendiavam, em derredor, achas de lenha embebidas em resina inflamável. Em poucos instantes, as labaredas lamberam-lhe o corpo envelhecido. Joana de Cusa contemplou com serenidade a massa de povo que lhe não entendia o sacrifício.

Os gemidos de dor lhe morriam abafados no peito opresso. Os algozes da mártir cercaram-lhe de impropérios a fogueira:— O teu Cristo soube apenas ensinar-te a morrer? — perguntou um dos verdugos. A velha discípula, concentrando a sua capacidade de resistência, teve ainda forças para murmurar:— Não apenas a morrer, mas também a vos amar!...Nesse instante, sentiu que a mão consoladora do Mestre lhe tocava suavemente os ombros, e lhe escutou a voz carinhosa e inesquecível:— Joana, tem bom ânimo!... Eu aqui estou!...

Humberto de Campos (Espírito)



sábado, 19 de fevereiro de 2011

A força do Espiritismo


Seria fazer uma idéia muito falsa do Espiritismo acreditar que sua força vem das manifestações materiais e que, impedindo essas manifestações, pode-se miná-lo em sua base. Sua força está na filosofia, no apelo que faz à razão, ao bom senso. Na Antiguidade, era objeto de estudos misteriosos, cuidadosamente escondidos do povo. Hoje, não tem segredos para ninguém; fala uma linguagem clara, sem equívocos.

Nele não há nada de místico, nada de alegorias passíveis de falsas interpretações; quer ser compreendido por todos, porque chegou o tempo de as pessoas conhecerem a verdade; longe de se opor à difusão da luz, ele a revela para todas as pessoas. Não exige uma crença cega, quer que se saiba por que se crê; ao se apoiar na razão, será sempre mais forte do que aqueles que se apóiam no nada. Os obstáculos que tentassem antepor à liberdade das manifestações poderiam lhe dar fim? Não, porque só produziriam o efeito de todas as perseguições: o de estimular a curiosidade e o desejo de conhecer o que é proibido. Por outro lado, se as manifestações espíritas fossem privilégio de um único homem, ninguém duvida que, pondo esse homem de lado, as manifestações acabariam. Infelizmente, para os adversários, elas estão ao alcance de todos, desde o simples até o sábio, desde o palácio até ao mais humilde casebre; qualquer um pode a elas recorrer. Pode-se proibir que sejam feitas em público; mas sabe-se precisamente que não é em público que elas se produzem melhor, e sim reservadamente. Portanto, como cada um pode ser médium, quem pode impedir uma família no seu lar, um indivíduo no silêncio de seu gabinete, o prisioneiro na cela, de ter comunicação com os Espíritos, apesar da proibição dos seus opositores e mesmo na presença deles?

Se as proíbem em um país poderão impedi-las nos países vizinhos, no mundo inteiro, uma vez que não há um país, em qualquer dos continentes, onde não haja médiuns? Para prender todos os médiuns seria preciso prender a metade da população humana; se até mesmo chegassem, o que não seria muito fácil, a queimar todos os livros espíritas, estariam reproduzidos no dia seguinte, porque sua fonte é inatacável, e não se podem prender nem queimar os Espíritos, que são seus verdadeiros autores.

O Espiritismo não é obra de um homem; ninguém se pode dizer seu criador, porque ele é tão antigo quanto a Criação; encontra-se por toda parte, em todas as religiões e na religião Católica ainda mais, e com mais autoridade do que em qualquer outra, porque nela se encontram os mesmos princípios: os Espíritos de todos os graus, suas relações ocultas e patentes com os homens, os anjos de guarda, a reencarnação, a emancipação da alma durante a vida, a dupla vista, as visões, as manifestações de todos os gêneros, as aparições e até mesmo as aparições tangíveis, isto é, as materializações. Com relação aos demônios, não passam de maus Espíritos e, salvo a crença de que foram destinados ao mal por toda a eternidade, enquanto o caminho do progresso está livre para os outros existe entre eles apenas a diferença de nome.

O que faz a ciência espírita moderna? Ela reúne num corpo de doutrina o que estava esparso; explica em termos próprios o que estava somente em linguagem alegórica; elimina o que a superstição e a ignorância produziram para deixar apenas a realidade e o positivo: eis seu papel; mas o de fundadora não lhe cabe. A Doutrina Espírita mostra o que é, coordena, mas não cria nada, por isso suas bases são de todos os tempos e de todos os lugares. Quem, pois, ousaria se acreditar forte o suficiente para abafá-la com sarcasmos e até mesmo com a perseguição? Se a proibirem num lugar, renasce em outros, no próprio terreno de onde a expulsaram, porque está na natureza e não é dado ao homem anular uma força da natureza nem opor seu veto aos decretos de Deus.

Afinal, que interesse haveria em entravar a propagação das idéias espíritas? Essas idéias, é bem verdade, se opõem aos abusos que nascem do orgulho e do egoísmo. Porém, esses abusos de que alguns se aproveitam prejudicam a coletividade humana que, portanto, será favorável às idéias espíritas, que terão como adversários sérios apenas aqueles que são interessados em manter esses abusos. Por sua influência, ao contrário, essas idéias, tornando os homens melhores uns para com os outros, menos ávidos dos interesses materiais e mais resignados aos decretos da Providência, são uma certeza de ordem e de tranqüilidade.

Extraído de O Livro dos Espíritos, conclusão, item 6, páginas 336 a 339, de Allan Kardec.