quinta-feira, 5 de maio de 2011

O candidato intelectual


O candidato intelectual

Conta-se que Jesus, depois de infrutíferos entendimentos com doutores da Lei, em Jerusalém, acerca dos serviços da Boa Nova, foi procurado por um candidato ao novo Reino, que se caracterizava pela profunda capacidade intelectual.

Recebeu-o o Mestre, cordialmente, e, em seguida às interpelações do futuro aprendiz, passou a explicar os objetivos do empreendimento. O Evangelho seria a luz das nações e consolidar-se-ia à custa da renúncia e do devotamento dos discípulos. Ensinaria aos homens a retribuição do mal com o bem, o perdão infinito com a infinita esperança. A Paternidade Celeste resplandeceria para todos. Judeus e gentios converter-se-iam em irmãos, filhos do mesmo Pai.

O candidato inteligente, fixando no Senhor os olhos arguciosos, indagou:

— A que escola filosófica obedeceremos?

— Às escolas do Céu — respondeu, complacente, o Divino Amigo.

E outras perguntas choveram, improvisadas.

— Quem nos presidirá à organização?

— Nosso Pai Celestial.

— Em que bases aceitaremos a dominação política dos romanos?

— Nas do respeito e do auxílio mútuos.

— Na hipótese de sermos perseguidos pelo Sinédrio em nossas atividades, como proceder?

— Desculparemos a ignorância, quantas vezes for preciso.

— Qual o direito que competirá aos adeptos da Revelação Nova?

— O direito de servir sem exigências.

O rapaz arregalou os olhos aflitos e prosseguiu indagando:

— Em que consistirá, desse modo, o salário do discípulo?

— Na alegria de praticar a bondade.

— Estaremos arregimentados num grande partido?

— Seremos, em todos os lugares, uma assembléia de trabalhadores atentos à vontade divina.

— O programa?

— Permanecerá nos ensinamentos novos de amor, trabalho, esperança, concórdia e perdão.

— Onde a voz imediata de comando?

— Na consciência.

— E os cofres mantenedores do movimento?

— Situar-se-ão em nossa capacidade de produzir o bem.

— Com quem contaremos, de imediato?

— Acima de tudo com o Pai e, na estrada comum, com as nossas próprias forças.

— Quem reterá a melhor posição no ministério?

— Aquele que mais servir.

O candidato coçou a cabeça, francamente desorientado, e continuou, finda a pausa:

— Que objetivo fundamental será o nosso?

Respondeu Jesus, sem se irritar:

— O mundo regenerado, enobrecido e feliz.

— Quanto tempo gastaremos?

— O tempo necessário.

— De quantos companheiros seguros dispomos para início da obra?

— Dos que puderem compreender-nos e quiserem ajudar-nos.

— Mas não teremos recursos de constranger os seguidores à colaboração ativa?

— No Reino Divino não há violência.

— Quantos filósofos, sacerdotes e políticos nos acompanharão?

— Em nosso apostolado, a condição transitória não interessa e a qualidade permanece acima do número.

— A missão abrangerá quantos países?

— Todas as nações.

— Fará diferença entre senhores e escravos?

— Todos os homens são filhos de Deus.

— Em que sítio se levantam as construções de começo? Aqui em Jerusalém?

— No coração dos aprendizes.

— Os livros de apontamento estão prontos?

— Sim.

— Quais são?

— Nossas vidas...

O talentoso adventício continuou a indagar, mas Jesus silenciou, sorridente e calmo.

Após longa série de interrogativas sem resposta, o afoito rapaz inquiriu, ansioso:

— Senhor, por que não esclareces?

O Cristo afagou-lhe os ombros inquietos e afirmou:

— Busca-me quando estiveres disposto a cooperar.

E, assim dizendo, abandonou Jerusalém na direção da Galiléia, onde procurou os pescadores rústicos e humildes que, realmente, nada sabiam da cultura grega ou do Direito romano, mantendo-se, contudo, perfeitamente prontos a trabalhar com alegria e a servir por amor, sem perguntar.



IRMÃO X
Chico Xavier
Extraída do livro Contos e apólogos, cap. 2.






















































































































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