quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Reflexões Sobre a Tolerância

Reflexões Sobre a Tolerância



Desejo ainda que você seja tolerante;

não com os que erram pouco, porque isso é fácil,

mas com os que erram muito e irremediavelmente,

e que fazendo bom uso dessa tolerância,

você sirva de exemplo aos outros.


Vitor Hugo



Ainda restam muitas mostras de brutalidade na raça humana. Desde ambientes domésticos até as mais conturbadas relações internacionais, vemos comportamentos agressivos e violentos, e não somente produzindo ferimentos físicos, mas também, e com maior freqüência, gerando sérios danos emocionais e conseqüentemente espirituais.


Na base de todas essas ocorrências encontram-se ações humanas, o que nos leva a refletir no quanto ainda nos exige a tarefa de tolerar o outro! Quantas vezes, ainda, escorregamos em julgamentos e, por vezes, na mesma intransigência e violência, se não por atos, por palavras e pensamentos. Compreender o outro é sempre tão difícil. Afinal, por que ele tem que pensar de forma diferente? Por que tem que agir de uma forma que não me agrada? Por que tem tendências que eu abomino, não compreendo ou não aceito? São tantos os porquês que nos ocorrem em momentos de intolerância que por certo encheríamos várias páginas com eles.
Mas, o certo é que diferenças existem e precisamos aprender a ser e viver com tolerância, caso realmente aspiremos a ser dignos de nos dizermos cristãos.
Há alguns meses foi noticiado o caso de uma mulher acusada de adultério na Nigéria. Ela estava divorciada do primeiro marido e engravidou de um relacionamento posterior com outro homem. Segundo as leis vigentes naquela sociedade ela foi condenada a morte por apedrejamento. Cena idêntica nos relata o Evangelho de João:


“Jesus, entretanto, foi para o monte das Oliveiras. De madrugada, voltou novamente para o templo, e todo o povo ia ter com ele; e, assentado, os ensinava. Os escribas e fariseus trouxeram à sua presença uma mulher surpreendida em adultério e, fazendo-a ficar de pé no meio de todos, disseram a Jesus: mestre, esta mulher foi apanhada em flagrante adultério. E na lei nos mandou Moisés que tais mulheres sejam apedrejadas; tu, pois, que dizes? Isto diziam eles tentando-o, para terem de que o acusar. Mas Jesus, inclinando-se, escrevia na terra com o dedo. Como insistissem na pergunta, Jesus se levantou e lhes disse: Aquele dentre vós que estiver sem pecado seja o primeiro que lhe atire a pedra. E tornando a inclinar-se, continuou a escrever no chão. Mas, ouvindo eles esta resposta e acusados pela própria consciência, foram-se retirando um por um, a começar pelos mais velhos até os últimos, ficando só Jesus e a mulher no meio onde estava. Ergueu-se Jesus e não vendo a ninguém mais além da mulher, perguntou-lhe:


– Mulher, onde estão aqueles teus acusadores? Ninguém te condenou? Respondeu ela: Ninguém, Senhor! Então lhe disse Jesus: Nem eu tampouco te condeno; vai e não peques mais.”


É a velha intolerância, matando pessoas e ferindo sentimentos nos tempos atuais, como matava e feria há dois mil anos. E os ensinos de Jesus, esquecidos.
A passagem da mulher adúltera me fala de tolerância, de comportamento tolerante com o próximo. O Mestre, enquanto ensinava, foi confrontado e atacado pela mesma intransigência e intolerância que os levava a acusar a mulher. Não toleravam os pensamentos e as atitudes de Jesus e o agrediam. Ante a primeira agressão, Jesus mostrou-se passivo. Então eles insistem até obterem uma reação - a resposta do atirem a primeira pedra quem estiver sem pecado.


Essa resposta traz a noção de igualdade, compreendida não só como não sermos puros isentos de erro, mas como seres que em situações absolutamente iguais, idênticas, tanto de ordem moral, material, mental, física, espiritual e evolutiva, procederíamos do mesmo modo, o que lhes retira a capacidade de condenar. Assim são as leis da matéria: em iguais condições os elementos químicos e físicos reagem da mesma forma; assim também as leis que regem o plano mental e as que vigoram nos domínios do Espírito, pois não há leis na Natureza que se contradigam umas as outras. Talvez por isso narra João que os velhos – ou os mais experientes e capazes de compreender esse conceito – foram os primeiros a se retirar, acusados pela própria consciência que os lembrava da lei de igualdade. Ao responder-lhes Jesus exemplifica uma conduta tolerante ante aqueles que os confrontavam. Aliás, note-se que ele deixa claro que a passividade não é forma de tolerância, pois ela permite que a ação equivocada perdure.
Ao responder a segunda investida, dá exemplo de tolerância inspirada pela bondade, ou seja, a não olhar indiferente, nem a condenar o proceder alheio quando ele seja incorreto, inconveniente e possa lesar interesses morais e materiais, próprios ou estranhos, individuais ou coletivos, mas alertar o engano da conduta de forma caridosa, sem revidar agressão, lembrando para o futuro um comportamento mais saudável.


Não temos o direito de violentar a consciência de outrem, impondo-lhes maneiras de pensar e viver. A justificativa do anseio de ampliar ou desenvolver a consciência de alguém não serve, nem autoriza o uso da violência física ou verbal.


A tolerância não consiste na indiferença. Pode e deve a criatura ser tolerante em face das opiniões e condutas alheias, por mais opostas que sejam às suas próprias; ela prescreve o respeito às crenças, aos gostos e tendências dos outros, porém não nos impõe a omissão, o silêncio diante do que nos desagrade, ou seja compreendido de outro modo. O indivíduo tolerante exterioriza suas opiniões, eximindo-se de ser violento, pois compreende a necessidade de considerar os outros como a si mesmo e a fazer-lhes aquilo lhe possa convir. Se já consegue olhar um pouco além das ilusões da matéria e compreende a vida e a lei de evolução, sabe que:

“Na fonte, há lama; a rosa tem espinho;

O sol na eclipse é sol obscurecido;

Na flor também o verme faz seu ninho;

Erram todos, eu mesmo errei já tanto",


William Shakespeare – Soneto 35.



Ana Cristina Vargas - Delfos


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