Em virtude da foto acima, publicada anteriormente, sendo sua efetivação no ano 2000, pelo fotógrafo amador Antonio Neury, irmão de Cidália, e envia-nos agora, em abril de 2010, exatamente dez anos após a reunião dos seis albergados da foto, todos com características e peculiaridades especificas e inerentes às suas personalidades.
Vejamos o nosso irmão Jaime, de camisa amarela, portador de problemas renais crônicos, deslocava-se ao Hospital Santa Terezinha a cada dois dias, para a realização da hemodialise, sempre retornando sofrido, abatido e, muitas vezes, raivoso.
O Sr. Jaime tinha um amigo de nome Alípio, que diariamente fazia a sua caminhada de 500 metros, motivo de orgulho e satisfação pelo grande feito físico. O percurso era dentro do terreno da Casa do Caminho. Após o exercício físico, uma outra maratona estava reservada: passar horas e horas em discussão por problemas desde o mais elementar, até o mais complexo. Algumas vezes chegavam a discussões acaloradas, prevendo até trovoadas mais fortes, entretanto um e outro apesar das durezas das palavras. Cada um, Jaime e Alipio, estavam convencidos de sua superioridade, concluídas as abordagens, os dois felizes e vitoriosos resmungavam de dentro de si da tamanha ignorância do seu parceiro.
Observemos uma discussão entre os dois. Jaime sempre afirmava que não existia Deus. Alípio defendia a existência de Deus. Alipio exemplificava que o vento era obra de Deus, não obstante, o Sr. Jaime com aparente conhecimento dizia: "que o vento era obra dos homens, pois acionavam grandes ventiladores e proporcionava a movimentação do ar".
Lamentavelmente, nem Alipio nem Jaime, conheciam o pensamente de La Rochefoucauld, que nesta frase de sua autoria comentava: “O melhor meio para ser-se enganado é considerar-se mais esperto do que os outros”.
Bem, já dá para perceber a que nível de questionamento os dois amigos entregavam-se. Certamente, essa discussão deve estar sendo produzida no mundo espiritual, com certeza, com uma orientação mais serena e detendo um auxiliar para suprir a falta de sabedoria de que eram detentores quando encarnados.
Na seqüência da foto, o Sr. Joaquim, alegre, pescador virtuoso, contador de estória de pescaria, voz forte de trovão, quando falava com raiva todos se calavam, homem valente, pavio curto, sempre está a desafiar quem ousasse falar de suas fragilidades e de seus limites.
Certo domingo, para assistir a missa do Idoso, quando todos vestiam as suas melhores roupas, o pescador Joaquim tinha um orgulho quando calçava um sapato, não obstante, a pessoa responsável por calçar os sapatos em Joaquim, na pressa, não percebeu que os sapatos estavam com os pés trocados e nada do querido irmão Joaquim conseguir andar. Algum tempo após, foi constatado a troca dos sapatos, motivo que o impedia de caminhar. Assim, depois de quase duas horas parado, o nosso irmão passa o final da manhã caminhando, elegantemente calçado, roupas bonitas, desfilando mostrando a todos a beleza do seu caminhar.
Outro ponto controvertido de Joaquim era o ciúme exagerado de sua filha Rita. Caso alguém falasse o nome de sua filha, ele pulava da cadeira e como se possuísse uma faca na cintura, partia com uma invisível arma branca em punho e partia para matar o primeiro que encontrasse. Para retornar ao estado normal era necessário lembrar que estava se referindo a Rita Lee, a cantora de rock.
O terceiro irmão da foto é o Cajazeirense Ascendino, foi assíduo freqüentador de todos os bares de Cajazeiras, relatava casos políticos de conceituados cajazeirenses e era ouvinte do programa do radialista Ademar Nonato, da 104 FM, passando a transmitir a todos as notícias e comentários divulgados no Rádio.
Por diversas vezes, fugiu a pé da Casa do Caminho até a cidade de Cajazeiras(38 km), sendo o motivo da fuga para comer um peba com cachaça, num bar próximo ao Hospital Regional de Cajazeiras. Para retornar a Casa do Caminho o argumento utilizado era convidá-lo para comer outro peba na rua das oficinas mecânicas. O difícil era convencê-lo a entrar na Kombi, pois, subindo o destino era a Casa. Inclusive, em uma destas buscas por Ascendino, o nosso irmão Hélio Zenaide foi eficiente no convencimento de Ascendino.
A principal característica de Ascendino, além da ausência de vaidade, era a sua afirmativa, em forma de demonstração da força espiritual e sabedoria, admitindo possuidor, quando pronunciava repetidamente a seguinte frase:
“Morreu acabou! Morreu acabou! Morreu acabou!.”
Jogava por terra, dessa forma, todo o conhecimento de que afirmava detentor.
Um caso interessante, ocorrido com Ascendino, foi a sua paixão por Francineide, à época, responsável pela alimentação dos Idosos, vindo a existir entre ambos uma grande simpatia, entretanto, Francineide era noiva com Gatico, com quem veio a casar-se e ter filhos. Francineide nutria por Ascendino um carinho de filha com pai, não obstante, Ascendino tinha a esperança de que um dia Francineide olharia de forma diferente para ele. Com o casamento entre Gatico e Francineide, ficou vários dias triste, deixando uma única vez, como vingança, escapar de sua boca a frase maldosamente pronunciada: "o primogênito que acabara de nascer não era do marido". Embora, tempos depois, arrependeu-se amargamente da infeliz e caluniosa citação.
Foi muito amigo de Thiago Guimarães, e, normalmente, aos domingos os dois iam tomar café na granja onde Thiago residia. Retornando, percebia os olhos de Ascendino quase fechado e confirmando: "o café da casa de Thiago era bom e forte".
Na verdade, hoje sabemos que iam tomar um pouco de vinho, conversar e retornavam para o almoço.
Muitas vezes chegava a perguntar se tinha bebido algo além do café. Ele afirmava que lá em Seu Thiago era servido apenas café.
Acreditamos, em verdade, que o nosso irmão Ascendino era um espírito experiente, desprendido dos bens materiais e normalmente dormia duas a três horas por noite.
Lamentavelmente, não realizamos o seu último desejo: "era morrer no mato, na floresta, junto as plantas que amava". Veio a desencarnar na UTI do Hospital.
O quarto irmão da foto é o Sr. Antonio, vivia só em uma montanha no município de Nazarezinho(PB), em condições sub-humanas.
Ao chegar à Casa foi reeducado, deixou de alimentar-se com as mãos, começando a levar a boca os alimentos com talheres e a não arrebatar a comida das mãos dos outros albergados. Algumas vezes, esquecia da necessidade de vestir-se e sai nu após o banho, diante de todos na maior naturalidade.
Certa feita, preparando as vacinas, dirigíamos ao curral de gado para vacinar, quando, de repente, o Sr, Antonio lá se encontrava, sozinho, tentando dominar um garrote e o mesmo o derrubou, fugiu do curral e saiu em direção ao final do terreno da Casa do Caminho, pois, apesar de gritarmos e solicitar que soltasse o animal, não obstante, o Sr Antonio não obedeceu e fomos encontrá-lo todo suado, arranhado, roupas rasgadas, espalhadas pelo chão, completamente nu, segurando o pescoço do animal, ambos profundamente cansados, e explicava ao animal que o mesmo lhe devia obediência.
O quinto irmão é o Sr. Chico, calado, humilde, riso fácil, era proprietário do carro de mão mais bonito e enfeitado da cidade de Sousa, tinha até bandeira do Brasil. Era um carro de quatro rodas, com direção de carro de verdade, que o mesmo empurrava e trabalhava pesado, carregando, frutas, verduras e cereais. Para adquiri-lo foram dezenas de anos de trabalho. Dizia que as pessoas mais importantes da cidade já tinham utilizado o seu serviço de entrega de mercadoria, pois fazia freguesia em várias bodegas da cidade. Não gostava de dar trabalho a ninguém, afirmava ser um homem de vergonha, respeito. Como homem de vergonha, dizia que: nunca fez vergonha a ninguém. Afirmava que mesmo sob o jugo de golpes dos maus, sempre amava, pois estava em busca da luz e não das trevas.
O sexto irmão é o Sr. Ozório, cuja vida foi de muito sofrimento. Ele afirmava que ficou doente desde que o levaram a João Pessoa, sendo interno em hospital para doentes mentais, segundo Osório, lá aplicaram uns choques que queimou todos os seus nervos. Era comum encontrar o nosso irmão atirando, para todos os lados, com uma arma de fogo fictícia, contra os seus inimigos desencarnados.
Era incapaz de agredir fisicamente qualquer pessoa, pois, sobretudo, era enfermo, descontrolado, articulista, dramático e megalomaníaco, além do mais, por diversas vezes, esteve na concessionária Rio Vale da cidade de Sousa e adquiriu de uma só vez quarenta carros, a princípio o rosto do vendedor era todo de alegria, sendo para entregar, de imediato, dois Vectras, cujo pagamento seria efetuado em dólar(vendedor?), moeda corrente em todas as suas transações. Essa compra rendeu uma discussão com o vendedor que acionou a policia e fomos avisados deste episodio que após explicar o comportamento de Ozório, foi desfeito o negócio.
Algumas semanas após o episódio da Rio Vale, o mesmo vai a sua terra natal “Campo Alegre”, distrito de Vieiropolis. Lá chegando, dirigiu-se a uma residência por trás da Capela católica e solicita a viúva, proprietária da residência que a desocupe, pois aquela residência era propriedade sua, e, diante da dona da casa residencial, exigia que desocupasse a residência.
A senhora comunicava que a casa foi herança do seu falecido marido. Ozório, em contrapartida, alterando a voz, dizia que aquela casa lhe pertencia, pois tinha comprado de seu compadre, o presidente do Brasil Juscelino Kubitsheck.
Após esse dialogo a Senhora percebeu que Ozório tinha problemas.
Mais uma vez fomos atrás de Ozório para felicidade da Viúva de Campo Alegre.
São dezenas de casos de Ozório de compras e vendas de boiada de 500 até 1000 cabeças de gado, compra de terras, pagamento de lanches, almoço, com pedaço de papel jornal, aluguel de vários taxis, cujo pagamento era para receber em seu escritório(Casa do Caminho) agressão a gerente de Banco por não lhe pagar em dólar, dentre tantos outros eventos constrangedores. Percebíamos, assim, pelo comportamento inconsciente, inconseqüente, de Ozório, a confirmação de uma sublime verdade de que a sede do ouro corrompe os mais sublimes ensinamentos.
Esses relatos, digitados apressadamente, sem preocupação com o vernáculo e sem nenhuma intenção de denegrir a imagem de nossos amados amigos, apenas, registramos uma faísca de sua valorosa personalidade, da fraternidade, de seus sofrimentos, físicos e morais, que os acompanharam nesta existência, consciente de que todos eles realizaram trabalhos de realce em outras existências, para serem nesta tão requisitados a adentrarem em provas difíceis a que se submeteram. Alguns ainda persistiam em manter um poder invisível que já não possuíam, pois não registramos em sua alma a arrogância, peculiar a muitos poderosos na Terra. Como ensina a sabedoria judaica: “A arrogância é o reino – sem a coroa”.
Pedimos a Deus todo poderoso, que derrame suas benções sobre os nossos seis irmãos que acabamos de mencionar algumas passagens de suas jornadas, neste século XX, pois, foram para nós exemplos vivos da Lei de Ação e Reação, deixando claro um salutar ensinamento do filósofo e matemático grego Pitágoras, quando em sua sabedoria assim se expressou: “Não cometas nenhum ato vergonhoso nem na presença de outros nem em segredo. A tua primeira lei deve ser o respeito a ti mesmo”.
Infelizmente, são ainda pouquíssimos os que se interessam pela sua evolução moral. A vida da maioria de nós é uma corrida desenfreada para os bens ilusórios, nos prendemos a coisas passageiras e efêmeras. Nós, esquecemos o que nos faria felizes, dentro da nossa possibilidade de sê-lo nesta Terra, que é fazer o bem e criar em torno de nós uma atmosfera de paz e de bem-estar.
Finalmente, a fraternidade nos aproxima, nos faz bem quando procuramos praticá-la em sua essência, não deixemos que a fraternidade brilhe mais nos discursos do que nos corações.
Amigo Walter !
ResponderExcluirComo gostaria de ter conhecido estes irmãos. Quanto ensinamentos benéficos nos proporcionou a serenidade, a maneira indelével e cosmopolita de suas vivências.
Este texto, para nossa sublime compreensão deve ser mantido desta forma como você narrou e escreveu, simples, carismática, notável.
Ainda, bem, que tive a chance de conhecer CHICO DE BOANERGES, frequentador "assiduo" da Casa do Caminho, conte uma de suas historias, gostaria muito de ouví-la. Um abraço, Josélio.