quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Os Gritos da Noite de São Bartolomeu - 24 de agosto de 1572

Massacre de São Bartolomeu, de François Dubois





Os Gritos da Noite de São Bartolomeu

Autor:
Allan Kardec

Fonte:
Revista Espírita
Setembro de 1858

HISTÓRICO

Na sua Histoire de l´ordre du Saint-Esprit, edição de 1778, De Saint-Foy cita a passagem seguinte, tirada de uma coletânea do Marquês Christophe Juvenal dês Ursins, tenente general do governo de Paris, escrita pelos fins do ano de 1572 e impressa em 160l.

“A 31 de agosto de 1572, oito dias após o massacre de São Bartolomeu, eu tinha ceado no Louvre, em casa da senhora de Fiesque. Durante todo dia havia feito muito calor. Fomos sentar-nos sob uma pequena latada, ao lado do riacho, para respirar ar fresco. De repente ouvimos no ar um barulho horrível de vozes tumultuosas e de gemidos misturados a gritos de raiva e de furor; ficamos imóveis, transidos de espanto, olhando-nos de vez em quando, mas sem coragem de falar. Creio que esse barulho durou cerca de meia hora. É certo que o rei Carlos IX o ouviu, ficou apavorado e não dormiu o resto da noite; contudo, não fez comentários no dia seguinte, mas foi notado o seu ar sombrio, pensativo e desvairado.

“Se algum prodígio deve não encontrar incrédulos, este é um, e é atestado por Henrique IV. Em seu livro I, capítulo 6, páginas 561, diz d´Aubigné: Várias vezes aquele príncipe nos contou entre os seus familiares e cortesãos mais íntimos – e tenho várias testemunhas vivas de que jamais no-lo repetiu sem sentir tomado de pavor – que oito dias depois do massacre da Noite de São Bartolomeu, havia visto uma grande quantidade de corvos pousar e crocitar sobre o pavilhão do Louvre; que na mesma noite Carlos IX, duas horas depois de se haver deitado, saltou da cama, fez com que os camareiros se levantassem, e mandou dar busca, pois ouvia no ar um grande barulho de vozes gementes, em tudo semelhantes às que se ouviam na noite do massacre; que todos esses gritos eram tão chocantes, tão marcados e tão distintamente articulados, que Carlos IX pensou fossem os inimigos dos Montmorency e os seus partidários atacando-os de surpresa, pelo que mandou um destacamento de sua guarda para impedir esse novo massacre; que os guardas informaram que Paris estava tranqüila e que todo aquele barulho que se ouvia estava no ar”.

Observação: O fato relatado tem muita analogia com a história do fantasma que aparecia a Mademoiselle Clairon, relatada em nosso numero de fevereiro, com a diferença que neste caso foi um único espírito a manifestar-se durante dois anos e meio, ao passo que depois da Noite de São Bartolomeu parece ter havido uma inumerável quantidade de Espíritos, que fizeram o ar vibrar apenas por alguns instantes. Aliás, ambos os fenômenos têm evidentemente o mesmo princípio que os outros fatos contemporâneos e da mesma natureza, por nós já relatados e deles não diferem senão em detalhes de forma. Interrogados sobre a causa desta manifestação, vários Espíritos responderam que era um castigo de Deus, o que é fácil de compreender.

Nota: São Bartolomeu foi um dos 12 apóstolos de Jesus Cristo. Pregou o Evangelho na Índia e na Armênia, onde foi crucificado no ano 71, por ordem de Astiage. A Noite de São Bartolomeu é o nome dado a uma das maiores chacinas feitas pelos católicos nos protestantes. Em linhas gerais os fatos foram estes: durante os séculos XVI e XVII, o Protestantismo desenvolveu-se na França sob duas seitas: os Calvinistas e os Luteranos; de 1560 a 1598 houve naquele país oito guerras religiosas, desencadeadas pela política católica que visava aniquilar o Protestantismo; a luta uniu ou federou aquelas seitas, cujo nome Huguenotes provavelmente de deriva do vocábulo alemão eidgenossen, isto é, federados, posto alguns suponham provir do da Torre do Rei Hugo, em Tours, onde aqueles se reuniam. Na célebre Noite de São Bartolomeu, a 24 de agosto de 1572, obediente às manobras dos católicos, e da rainha mãe, Catarina de Médicis, Carlos IX, rei da França, ordenou a matança dos Huguenotes, dando ele próprio o sinal do início da carnificina. O fato passou à História com os nomes de Noite de São Bartolomeu e de Matança do Huguenotes, inspirando de várias maneiras os artistas, entre os quais Meyerbeer, que em 1836 escreveu a célebre ópera Os Huguenotes.

Estas lutas religiosas explicam o interesse e esforço francês por uma França Antártica e o aparecimento na História fo Brasil, de nomes como os de Villegaignon, Duguay-Troin e Coligny.



A noite de São Bartolomeu

Noite de 23 para 24 de agosto de 1572: os sinos da catedral de Saint Germain-l’Auxerrois fazem o prenúncio do dia de São Bartolomeu, (que foi um mártir). De todos os cantos da cidade, acorrem integrantes de uma milícia popular. Começa o terror. Portas e janelas são arrombadas. Com o toque dos sinos, ouvem-se também terríveis gritos assassinos. Começa o massacre da noite de São Bartolomeu.

Na noite de São Bartolomeu de 1572, os católicos massacraram os huguenotes. Somente em Paris, três mil protestantes foram exterminados nessa noite. A violência estava espalhada por todo o país, o número de huguenotes mortos foi de dezenas de milhares.

Poucos dias antes, era calmo o ambiente na capital Paris. Celebrara-se um matrimônio real, que deveria pôr fim um terrível decênio de lutas religiosas entre católicos e huguenotes. Os noivos eram Henrique, rei de Navarra e chefe da dinastia dos huguenotes, e Margarida Valois, princesa da França, filha do falecido Henrique II e de Catarina de Médicis. Margarida era irmã do rei Carlos IX.

Alguns milhares de huguenotes de todo o país – a fina flor da nobreza francesa – foram convidados a participar das festas de casamento em Paris. Uma armadilha sangrenta, como se constataria mais tarde.

A guerra entre católicos e protestantes predominou na França durante anos, com assassinatos, depredações e estupros. E agora, um casamento deveria fazer com que tudo fosse esquecido?

O casamento não foi realizado na catedral. O noivo protestante não deveria entrar em “Notre Dame”, nem assistir à missa. Diante do portal ocidental da catedral, foi construído um palco sobre o rio Sena, no qual celebrou-se o casamento. Margarida não respondeu com um "sim" à pergunta se desejava desposar Henrique, mas fez simplesmente um aceno positivo com a cabeça. Como era comum na época, o casamento tinha motivação exclusivamente política.

No século XVI o maior esteio da França não era o rei, mas sim a Igreja. E esta encontrava-se inteiramente infiltrada pela nobreza católica. Uma reforma no clero significaria, ao mesmo tempo, o tolhimento do poder dos príncipes. Assim, a nobreza – tendo à frente os Guise – buscava a preservação do status quo.

Por isso, os Guise – a linhagem predominante na França – observavam com profunda desconfiança a cerimônia ao lado da “Notre Dame”. O casamento foi realizado por determinação da poderosa rainha-mãe Catarina de Médicis – uma mulher fria, detentora de um marcante instinto de poder.

Poucos dias depois da cerimônia de casamento, ocorreu um fato desastroso. O almirante Coligny sofreu um atentado em rua aberta. O líder huguenote teve apenas ferimentos leves. Ainda assim, os huguenotes pressentiram uma conspiração. Estava em perigo a trégua frágil, lograda através do casamento. Por trás do atentado, estavam os Guise e Catarina de Médicis.

Segundo o Histoire et Dictionnaire des Guerres de Religion (Arlette Jouanna et allia, Paris, Robert Laffont, 1998), o autor teria sido Charles de Louvier, senhor de Maurevert, que já tinha em sua folha corrida o assassinato, em 1569, de Artus de Mouy, um seguidor de Coligny.

Até hoje não se sabe quem encomendou o crime. Alguns historiadores falam, como já vimos, de Catherine de Médicis.

Embora os historiadores não tenham chegado a nenhuma conclusão sobre a autoria intelectual do crime, o fato é que o atentado representou um dos episódios mais sangrentos da história das guerras de religiões. O atentado contra Coligny lembra um outro atentado crucial, em 1936, quando o assassinato de Calvo Sotelo deu o sinal para o desfecho da Guerra Civil Espanhola, que deixou um saldo estimado em um milhão de cadáveres.

Tudo – o casamento, a festa pomposa – era parte de um plano preparado a longo prazo. Carlos IX o rei, com um olhar de louco, ficou furioso ao saber do atentado a Coligny, que era seu conselheiro e confidente. Os católicos espalharam então o boato de que os huguenotes estavam planejando uma rebelião para vingar-se do atentado.

O plano diabólico teve início. O rei Carlos foi pressionado por sua mãe, Catarina. Carlos vacilou, ficou inseguro. Mas cedeu finalmente, e ordenou a execução de Coligny. E exigiu um trabalho completo: não deveria sobrar nenhum huguenote que pudesse acusá-lo posteriormente do crime.

Coligny foi assassinado com requintes de crueldade na noite de São Bartolomeu. E com ele, milhares de pessoas que professavam a mesma fé.

E Henrique de Navarra? Ele sobreviveu à noite de São Bartolomeu nos aposentos do rei, que tinha dado a ordem para o massacre. Henrique teve de renegar a sua fé e foi encarcerado no Louvre. Quatro anos mais tarde, ele conseguiu fugir. Retornou ao seu reino na Espanha e, anos depois, subiu ao trono francês.

Henrique, que permaneceu católico, mas irmão espiritual dos huguenotes, concedeu-lhes a igualdade de direitos políticos através do Edito da Tolerância de Nantes. Uma compensação tardia para os huguenotes.

Henrique defendia a coesão do país: "A França não se dividirá em dois países, um huguenote e outro católico. Se não forem suficientes a razão e a Justiça, o rei jogará na balança o peso da sua autoridade".

Em verdade, o rei pretendia eliminar um número limitado de líderes huguenotes. O que não havia previsto, segundo os autores do Histoire et Dictionnaire des Guerres de Religion, é que a execução limitada aos chefes daria o sinal de um massacre, que em Paris durou até o 29 de agosto, com um paroxismo de violência durante os primeiros três dias.

Há quem fale de setenta mil a cem mil mortos. Segundo relatos, os cadáveres boiaram nos rios durante meses, de modo que ninguém comia peixe.

Quem deve ter ficado muito feliz com o massacre foi o papa Gregório XIII, que cunhou uma medalha comemorativa da data e encarregou Giorgio Vasari de pintar um mural celebrando o massacre.

http://www.baguete.com.br/colunasDetalhes.php?id=2513



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