MARIA DE MAGDALA
“Um dos fariseus convidou-o
para jantar com ele. E entrando na casa do fariseu, tomou lugar à mesa. Havia
na cidade uma mulher que era pecadora, e esta, sabendo que ele estava jantando
na casa do fariseu, trouxe um vaso de alabastro com perfume e, pondo-se-lhe aos
pés, chorando, começou a regá-los com lágrimas, e os enxugava com os cabelos da
sua cabeça, e beijava-lhe os pés e ungia-os com perfume. Ao ver isto, o fariseu
que o convidara, dizia consigo: se este homem fosse profeta; saberia quem é que
o toca e que sorte de mulher é, pois é uma pecadora. Então Jesus disse ao
fariseu: Simão, tenho uma coisa para te dizer. Ele respondeu: Dize-a, Mestre.
Certo credor tinha dois devedores; um lhe devia quinhentos denários, e o outro
cinqüenta. Não tendo nenhum dos dois com que pagar, perdoou a dívida a ambos.
Qual deles, portanto, o amará mais? Respondeu Simão: suponho que aquele a quem
mais perdoou. Replicou-lhe: Julgaste bem. E virando-se para a mulher, disse a
Simão: vês esta mulher? Entrei na tua casa e não me deste água para os pés, mas
estamos regou com lágrimas e os enxugou com os seus cabelos. Não me deste
ósculo; ela porém, desde que entrou, não cessou de beijar-me os pés. Não
ungiste a minha cabeça com óleo, mas esta com perfume ungiu os meus pés. Por
isso te digo: Perdoados lhe são os seus pecados, que são muitos, porque ela
muito amou. Mas aquele a quem pouco se perdoa, pouco ama. E disse à mulher:
perdoados são os teus pecados. Os que estavam com ele à mesa começaram a dizer
consigo mesmos: Quem é este que até perdoa pecados? Mas Jesus disse à mulher: A
tua fé te salvou; vai-te em paz.”
(Lucas, VII, 36-50.)
“Ora, estando Jesus em
Betânia, na casa de Simão, o leproso, chegou-se a ele uma mulher que trazia um
vaso de alabastro com precioso perfume, e lho derramou sobre a cabeça, quando
ele estava à mesa. Vendo isto, os seus discípulos indignaram-se e disseram:
Para que este desperdício? Pois o perfume podia ser vendido por muito dinheiro
e ser este dado aos pobres. Mas Jesus percebendo isto, disse-lhes: Por que
molestais esta mulher? Pois ela me fez uma boa obra. Porquanto os pobres sempre
os tendes convosco, mas a mim nem sempre me tendes; porque derramando ela este
perfume sobre o meu corpo, fê-lo para a minha sepultura. Em verdade vos digo
que onde quer que for pregado em todo, o mundo este Evangelho, será também
contado para memória sua, o que ela fez.”
(Mateus, XXVI, 6-13.)
“Quando iam de caminho,
entrou ele em uma aldeia; e uma mulher chamada Marta hospedou-o. Esta tinha uma
irmã chamada Maria, a qual, sentada aos pés de Jesus, ouvia o seu ensino.
Marta, porém, andava preocupada com muito serviço; e chegando-se disse: Senhor,
a ti não se te dá que minha irmã me tenha deixado só a servir? Dize-lhe, pois,
que me ajude. Mas respondeu-lhe o Senhor: Marta, Marta, estás ansiosa e te
ocupas com muitas coisas; entretanto poucas são necessárias, ou antes uma só;
porque Maria escolheu a boa parte que não lhe será tirada.”
(Lucas, X, 38-42.)
“Logo depois andava Jesus
pelas cidades e aldeias, pregando e anunciando as boas novas do Reino de Deus,
e iam com ele os doze e algumas mulheres que haviam sido curadas de espíritos
malignos e de enfermidades; Maria, chamada Madalena, da qual tinham saído sete
demônios, Joana, mulher de Cusa, procurador de Herodes, Suzana e muitas outras,
as quais o serviam com os seus bens.”
(Lucas, VIII, 1-3.)
“Era o dia da Parasceve (*),
e ia começar o sábado. E as mulheres que tinham vindo da Galiléia com ele,
seguindo a José, viram o túmulo e como o corpo de Jesus fora posto nele;
voltando depois, prepararam aromas e bálsamos.”
(*) Parasceve: a sexta feira, entre os judeus, dia em que eles
se preparavam para celebrar o sábado. Na liturgia Católica é a sexta feira
santa.
(Lucas, XXIII, 54-56.)
“Maria, porém, estava
junto à entrada do túmulo, chorando. E enquanto chorava, abaixou-se e olhou
para dentro do túmulo, e viu dois anjos com vestes brancas, sentados onde o
corpo de Jesus fora posto, um à cabeceira, outro aos pés. Eles lhe perguntaram:
Mulher, por que choras? Respondeu ela: Porque tiraram o meu Senhor, e não sei
onde o puseram. Tendo dito isto, virou-se para trás e viu a Jesus em pé, mas
sem saber que era ele. Perguntou-lhe Jesus: Mulher por que choras? A quem
procuras? Ela supondo ser o jardineiro, respondeu: Senhor, se tu o tiraste,
dize-me onde o puseste, e eu o levarei. Disse-lhe Jesus: Maria! Ela virando-se
disse-lhe: Mestre! Disse-lhe Jesus: Não me toques; porque ainda não subi a meu
Pai, mas vai a meus irmãos e dize-lhes que subo para meu Pai e vosso Pai, para
meu Deus e vosso Deus. Maria Madalena foi contar aos discípulos: Vi o Senhor, e
ele disse-me estas coisas!”
(João, XX, 11-18.)
Maria Madalena é a mulher
de quem Jesus expeliu sete espíritos maus. Cheia de gratidão pela graça que
obtivera, vai à casa de Simão, sabendo que Jesus lá estava; sem se preocupar
com a dignidade do fariseu, sem temer escândalos nem preconceitos, lança-se aos
pés do Divino Mestre e lhe oferece tudo o que tem: perfume, lágrimas, coração e
espírito! A extraordinária mulher não abandona mais o seu Salvador: segue-o por
toda parte acompanhada daquele préstito de mulheres que, como ela, haviam
recebido graças e espalhavam sobre os passos do extraordinário Messias o eterno
perfume das suas esperanças.
Lição profunda que precisa
tornar-se conhecida para proveito de todos.
Não é só pela inteligência
que o homem se eleva a Deus, mas também pelo coração, pelo sentimento.
O sentimento é a alma da
virtude, é o motor das grandes ações.
É o sentimento que
transforma e modela a alma; é ainda o sentimento que exprime todos os afetos
puros, todas as gratidões imorredouras.
Tanto na mulher como no
homem, o sentimento é a corda vibrátil das grandes emoções.
Platão, impulsionado pela
palavra de Sócrates, põe de lado tudo o que é do mundo e com seu Mestre vai
cultivar a Beleza e a Bondade, que sintetizam a sabedoria universal.
Madalena, arrebatada pelo
amor de Jesus, renuncia aos gozos da Terra e segue os passos do Galileu
Humilde, em sua alta missão de regeneração e redenção.
A palavra do Moço da
Galiléia, repassada de doçura, cheia de mansidão, a arrebata, e, com ele,
inicia sua tarefa de caridade e de amor!
A Doutrina Judaica, cheia
de preconceito para com as mulheres, foi esmagada pelo brado do amor divino,
pelo Verbo poderoso de Deus!
Libertador da mulher, o
Cristo outorgou-lhe a missão de amar e profetizar; revestiu-a das faculdades
preciosas do Espírito para a realização do divino desiderato de unir ambos os
mundos, ambas as Humanidades: a Humanidade que se arrasta na Terra, e a
Humanidade que flutua nos Céus!
A história de Maria de
Magdala é a história da reabilitação da mulher; para o cumprimento de seus
deveres cristãos, Jesus não faz seleção de sexo em seus trabalhos missionários.
Ao contrário, acerca-se das mulheres, que, mesmo sem que Ele falasse,
pressentiam, naquela eminente Figura, o Messias prometido.
A intuição lhes dizia, no
fundo dai ma, que elas estavam diante do Filho de Deus.
Não era preciso que Jesus
lhes demonstrasse sua Individualidade, que fizesse milagres e prodígios para
que cressem: elas adivinhavam. E é sem dúvida por esse motivo que o Mestre, na
folga de seus trabalhos missionários, tinha prazer em descansar ria Aldeia de
Betânia, onde, com especialidade, se hospedava em casa de Marta, Maria e
Lázaro. Era ali que ele se abria em suas consolações mais doces e que, em
amenas palestras, falava da Vida de além-túmulo, cujos ensinos não ousava ainda
confiar a seus discípulos.
Nos tempos primitivos
havia um grande desprezo pela mulher.
***
A mulher era um ser
secundário, sem primazia intelectual, entretanto, não podiam deixar de
reconhecer na mulher um instrumento suscetível às manifestações psíquicas.
Quer da manifestação dos
fenômenos de animismo, quer dos fenômenos propriamente espíritas, o sexo
feminino sobrepuja o chamado sexo forte; é mais passível, mais dócil, mais
dotado de sensibilidade, e, pois, de mediunidade.
Segundo afirmam diversos
observadores, dentre estes Pitrés, um terço das mulheres é dotado de
mediunidade, ao passo que no sexo masculino só um quinto de homens possui essa
faculdade.(*)
(*) Não obstante, cumpre observar que a mediunidade existe em
estado na quase totalidade das criaturas humana, de ambos os sexos.
Em 360 pessoas
magnetizadas por Bertillon, 265 eram mulheres, 50 homens, e 45 meninos. De um
estudo feito em 17.000 indivíduos, a mulher representa percentagem mediúnica
de 12 por cento, ao passo que o homem não excede a 7 por cento, quase a metade.
Que quer dizer esta estatística, se não que as mulheres são mais suscetíveis às
coisas divinas que os homens? Os sacerdotes das antigas religiões, que eram
profundos no estudo da alma, compreendiam muito bem o poder da mulher como
intermediária entre o mundo visível e o invisível. E tanto isso é verdade que a
mulher era escolhida para todos os fins de mediunidade.
O Oráculo de Delfos, tão
famoso na História, era dirigido por sacerdotes, por homens, mas o exercício do
mediunismo estava afeto às mulheres.
Entre os judeus, segundo
refere o Velho Testamento, as mulheres mantinham relações com os Espíritos.
Maria, irmã de Moisés, era profetisa, assim como Débora e Holda. No Endor o
Espírito de Samuel é evocado por uma mulher. Vemos em o Novo Testamento que a
profecia era exercida por mulheres, de preferência a homens.
O Apóstolo Paulo chega a
desligar e a adormecer a mediunidade de uma moça, que disso tirava proventos
para seus senhores.
Na Galiléia e na Betânia,
as mulheres mereciam mais confiança para a profecia do que os homens.
Por fim, os sacerdotes
deliberaram destituir a mulher, privando-a das suas funções proféticas. É
possível que daí se originasse o vestuário e a raspagem do rosto dos padres.
O grande criminalista,
Cesar Lombroso, dedica um capítulo do seu livro Espiritismo e Hipnotismo a este
fato, em verdade digno de exame.
Por que o padre usa
batina? Por que o padre não usa barba e bigode?
Mas não entremos nessas
indagações; continuemos com nosso tema, que é a libertação da mulher das peias
materiais.
Maria, de Betânia, é uma
figura saliente no Evangelho; seu amor acendrado por Jesus faz dela a
verdadeira mulher espiritual. Muitos escritores sacros exaltam o nome de Maria
Madalena, e a própria Igreja chegou a santificá-la. São Modesto, grande
prelado, diz que Madalena era a cabeça e diretora das pessoas de seu sexo, que
iam após Jesus Cristo. No começo do século VIII, as Igrejas do Oriente e do
Ocidente estabeleceram o culto a Madalena, Os religiosos gregos tributavam-lhe
culto e a consideravam igual aos Apóstolos.
De fato, a simpática
figura, a quem dedicamos uma página do nosso livro, é digna da mais expressiva
consideração e do mais acrisolado amor.
Se estudarmos a vida de
Maria Madalena, veremos a extrema dedicação que ela votava a Jesus. O amor
gentílico foi substituído, naquela criatura, pelo amor divino, e, por toda
parte, ela segue, com rara abnegação, o seu Salvador!
Em todos os passos
dolorosos da Vida do Redentor, aparece Maria como o símbolo, a personificação
da mulher espírita.
Arrastado ao Calvário,
Maria acompanha a Jesus: pregado este na cruz infamante, ela não o abandona:
ajoelhada; de cabelos em desalinho, participa da agonia!
Jesus expira, lançam seu
corpo num sepulcro; ela afasta-se, porque, a isso é constrangida por soldados
pretorianos; mas não se contém; enquanto uns fogem atemorizados e outros se
escondem e temem, ela, a mulher extraordinária, não pensa em si mesma, não
cogita dos males que lhe poderiam advir, mas prepara bálsamos perfumados e
volta ao sepulcro para dar o seu testemunho de amor sincero àquele que lhe dera
a vida da alma, deixando ver que, nem mesmo a morte tem poder para extinguir do
seu espírito os sinceros afetos que devota a seu Mestre!
E foi então que,
caminhando de um lado para outro, no paroxismo de sua dor, Maria é mais uma vez
agraciada com a visão do seu Senhor, que, em voz maviosa chama-a pelo seu
próprio nome: “Maria!”
Louca de júbilo,
precipita-se aos pés de Jesus Espírito, e ele pede-lhe evitar o contato, porque
não havia ainda dado conta ao Pai celestial da sua tarefa. Logo após, estando
ela com outras santas mulheres, Jesus lhes aparece e dá-lhes a recomendação:
“Ide e dizei a meus irmãos que partam para a Galiléia, porque será lá que eles
me verão.”
E na mesma tarde a
mensagem tem o seu cumprimento: “Estando os onze reunidos, com as portas
fechadas, viram Jesus entrar. Ele tomou o seu lugar entre eles, falou-lhes com
doçura, increpando-os pela sua incredulidade, depois lhes disse: “Ide para
Jerusalém, e não vos retireis de lá até que se cumpram os dias em que haveis de
receber o Espírito, para depois sairdes por toda parte a pregar o Evangelho.”
Enfim, Madalena é o espelho
no qual as mulheres cristãs devem mirar-se para serem felizes não só nesta vida
como também na outra.
O Espiritismo, salientando
o papel que Madalena desempenhou no Cristianismo, vem concorrer para a
libertação da mulher do fardo do mundo e do jugo das religiões sacerdotais. Vem
garantir-lhe o direito do estudo, do livre-exame e até do apostolado.
É no trabalho espírita,
porque não lhe faltam dons, que a mulher pode progredir com maior facilidade; é
pelo estudo e pela instrução que ela se libertará do preconceito e das modas
nefastas que a deprimem, tornando-a fator da concupiscência e da sensualidade.
O mundo se transforma; a
mulher precisa renovar-se no Espírito do Cristo!
Dotada de sensibilidade e
receptividade para as revelações do Além, ela deve tornar-se dócil, estudar,
instruir-se, para libertar-se do jugo da Igreja, e, consciente de seus deveres
e de seus dons, auxiliar a obra de espiritualização, sob o influxo do Espírito
da Verdade, encarregado de realizar, na Terra, o Reino de Deus.
Cairbar Schutel
Parábolas e Ensinos de
Jesus
(1ª Edição -1928)
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