RAUL TEIXEIRA E A
GREVE DOS PROFESSORES
"Seria tão bom se pleiteássemos melhorias
salariais na medida em que estejamos oferecendo à sociedade também um melhor
trabalho, oferecendo também à sociedade algo melhor.
Será importantíssimo que a nossa dificuldade
financeira não recaia sobre os outros. Seja um problema nosso. Vamos batalhar,
vamos lutar, tendo muito cuidado com os movimentos que façamos em nome dessa
dificuldade salarial. Quando nós pensamos, por exemplo, em parar de trabalhar,
nós criamos um problema muito sério com aqueles que dependem do nosso trabalho.
Porque numa greve de professores não são os filhos dos ricos que sofrem, não
são os filhos dos governantes que sofrem, é o povo.
[...]
Ganhar melhor sim, mas dar, também, o nosso
melhor."
***
Utilizamos as sábias palavras de José Raul Teixeira,
ex-professor de física da Universidade Federal Fluminense, e também grande
médium e orador espírita, para analisar nosso comportamento numa época de
greves e protestos populares.
O tempo é azado para recordarmos proveitoso relato de
um episódio da vida do professor Raul, relatado por ele mesmo, em palestra
espírita há alguns anos.
O caso ocorreu em sua juventude, quando ainda
trabalhava na educação pública em Niterói, município fluminense. A época era
também de grande agitação política e social. Os professores organizavam-se
ruidosamente em assembleia, a fim de realizar uma passeata ou manifestação para
reivindicar, sobretudo, uma melhor remuneração do governo.
Apesar de já labutar na Causa Espírita, sobretudo no
setor mediúnico, Raul era um dos mais exaltados, e preludiava palavras de
ordem:
- Companheiros, não podemos permitir que a situação
atual continue. Devemos lutar, protestar, gritar para que os governantes nos
ouçam!
Raul, ovacionado, recebia o apoio dos
"companheiros de luta". Quando, porém, preparava-se para levantar
novamente a voz, observou com os olhos de médium vidente a figura do seu
principal mentor desencarnado, Camilo, caminhando em sua direção vindo do fundo
do salão.
Contou-nos, com humor, o que pensou no momento quando
avistou o amigo invisível aos demais:
- O que Camilo faz aqui? Lugar de mentor não é no
centro espírita à noite?
O Espírito orientador, bom e sereno, repreendeu-lhe:
- Meu filho, o que fazes? Não instigues a revolta! Não
deverias participar disso.
Raul, ainda envolvido naquele ambiente, ainda pensou
bem-humorado:
- Puxa, deve ser bom ser mentor desencarnado! Não
precisa trabalhar duro para receber um salário minguado no fim do mês; não
precisa comer, pagar o aluguel, a conta de água, luz, gás...
Camilo, após ouvir o pensamento do médium, sorriu para
Raul e respondeu-lhe com a mansidão de sempre:
- Meu filho, não sejas leviano! Esqueceste que para
estarmos aqui [como mentores espirituais] tivemos também que passar por tudo
isso? As dificuldades de vós [dele e dos outros professores] não existem por
acaso. Em existências pretéritas, quisestes ser mais espertos do que os outros.
Explorastes os mais fracos e enriquecestes injustamente sobre eles. Não
deveríeis receber nada nesta existência, mas a Espiritualidade Maior é
misericordiosa. O que tu chamas de "salário minguado" é na realidade
uma "ajuda de custo" que Deus vos concede para não morrerdes de fome,
a fim de cumprirdes vossa jornada terrena em busca da redenção das pesadas
dívidas passadas.
Neste momento da palestra, nós, ouvintes, pensamos nos
escravocratas e demais capitalistas inescrupulosos do passado, que fizeram
fortuna com o suor, sangue e lágrimas dos irmãos menos favorecidos.
Como Raul emudeceu por alguns segundos, os
companheiros da assembleia lhe chamaram a atenção:
- Continua, Raul! O que devemos fazer? Vamos fazer
greve?
Com o semblante mais calmo, o professor e espírita
mudou o tom de voz:
- Companheiros, não é bem assim... Acho que devemos
ter calma e paciência e procurar outros meios de reivindicação.
Sobressaltados pela mudança repentina do amigo, um
deles arguiu-lhe:
- Mas Raul, você disse que deveríamos continuar!
- Mudei de ideia. Pensando bem, não é pelo grito e
pela paralisação de nossas atividades que iremos melhorar a situação do ensino
público. Antes de tudo, vamos pensar em nossos alunos, que não têm culpa
alguma, para não prejudicá-los.
Ao deixar o recinto, não é preciso dizer que esse foi
o fim da breve carreira do professor Raul Teixeira como grevista.
Jen Soares
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