Explicações do Mestre
Em plena conversação
edificante, Sara, a esposa de Benjamim, o criador de cabras, ouvindo
comentários do Mestre, nos doces entendimentos do lar de Cafarnaum, perguntou,
de olhos fascinados pelas revelações novas:
— A idéia do Reino de
Deus, em nossas vidas, é realmente sublime; todavia, como iniciar-me nela?
Temos ouvido as pregações à beira do lago e sabemos que a Boa Nova aconselha,
acima de tudo, o amor e o perdão... Eu desejaria ser fiel a semelhantes
princípios, mas sinto-me presa a velhas normas. Não consigo desculpar os que me
ofendem, não entendo uma vida em que troquemos nossas vantagens pelos
interesses dos outros, sou apegada aos meus bens e ciumenta de tudo o que
aceito como sendo propriedade minha.
A dama confessava-se com
simplicidade, não obstante o sorriso desapontado de quem encontra obstáculos
quase invencíveis.
— Para isso — comentou
Pedro —, é indispensável a boa-vontade.
— Com a fé em Nosso Pai
Celestial — aventurou a esposa de Simão —, atravessaremos os tropeços mais
duros.
Em todos os presentes
transparecia ansiosa expectativa quanto ao pronunciamento do Senhor, que falou,
em seguida a longo silêncio:
— Sara, qual é o serviço
fundamental de tua casa?
— É a criação de cabras —
redarguiu a interpelada, curiosa.
— Como procedes para
conservar o leite inalterado e puro no benefício doméstico?
— Senhor, antes de
qualquer providência, é imprescindível lavar, cautelosamente, o vaso em que ele
será depositado. Se qualquer detrito ficar na ânfora, em breve todo o leite se
toca de franco azedume e já não servirá para os serviços mais delicados.
Jesus sorriu e explanou:
— Assim é a revelação
celeste no coração humano. Se não purificamos o vaso da alma, o conhecimento,
não obstante superior, se confunde com as sujidades de nosso Intimo, como que
se degenerando, reduzindo a proporção dos bens que poderíamos recolher. Em
verdade, Moisés e os Profetas foram valorosos portadores de mensagens divinas,
mas os descendentes do Povo Escolhido não purificaram suficientemente o
receptáculo vivo do espírito para recebê-las. Ë por isto que os nossos
contemporâneos são justos e injustos, crentes e incrédulos, bons e maus ao mesmo
tempo. O leite puro dos esclarecimentos elevados penetra o coração como alimento
novo, mas aí se mistura com a ferrugem do egoísmo velho. Do serviço renovador
da alma restará, então, o vinagre da incompreensão, adiando o trabalho efetivo
do Reino de Deus.
A pequena assembléia, na
sala de Pedro, recebia a lição sublime e singela, comovidamente, sem qualquer
interferência verbal.
O Mestre, porém,
levantando-se com discrição e humildade, afagou os cabelos da senhora que o
interpelara e concluiu, generoso:
— O orvalho num lírio alvo
é diamante celeste, mas, na poeira da estrada, é gota lamacenta. Não te
esqueças desta verdade simples e clara da Natureza.
JESUS NO LAR
FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER
DITADO PELO ESPÍRITO NEIO
LÚCIO
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