AO COMPANHEIRO ESPÍRITA
E - Cap. XVII - Item 4 *
Afirma Allan Kardec "que se
reconhece o verdadeiro espírita por sua transformação moral e pelos esforços
que emprega para domar as tendências inferiores".
Quem se transfigura por dentro,
no entanto, pensa por si e quem raciocina por si desata as amarras dos
preconceitos e escala renovações, no rumo do conhecimento superior pelas vias
do espírito.
É por isso que o raciocínio claro
te arrancou ao ninho da sombra.
Não mais para nós o claustro
nebuloso da fé petrificada em que se nos desenvolvia o entendimento, em
multimilenária gestação.
Cessou para nós a nutrição mental
por endosmose, no bojo dos pensamentos convencionais.
Todavia, porque te transferes
incessantemente de nível, quase sempre, despertas no mais doloroso tipo de
solidão - a solidão dos que trabalham no mundo, a benefício do mundo, mas
desajustados no mundo, sem que o mundo os reconheça.
°°°
Falas - e frequentemente, as tuas
palavras voam sem eco.
Ages - as tuas ações nobres
sofrem, não raro, o menosprezo dos mais queridos.
Emancipas a própria alma -
escravizando-te a deveres maiores.
Auxilias - desdenhado.
Compreendes - desdenhado.
Trabalhas - padecente.
Edificas - por entre lágrimas.
Consola - e vergastam-te os
sentimentos.
Cultivas o bem - e arrasam-te o
campo.
Urge perceber, porém, que quantos
consomem as próprias energias, na exaltação do bem, se fazem clarão, e aos que
se fazem clarão as sombras não mais oferecem lugar em meio delas.
Segue, assim, trilha adiante,
erguendo a luz para que as trevas não amortalhem, indefinidamente, os valores
do espírito.
Se temes a extensão das
dificuldades, reflete na semente, a morrer em refúgio anônimo para que a vida
se garanta; mas, se o exemplo de um ser pequenino te não satisfaz, medita no
ensinamento do maior e mais glorioso espírito que já pisou caminhos terrestres.
Ele também transitou, na estância dos homens, sem pouso certo. Para nascer,
socorreu-se da hospitalidade dos animais; enquanto esteve diretamente no mundo,
não reteve uma pedra em que resguardar a cabeça; transmitiu a sua mensagem
libertadora em recintos de empréstimos e, em vista das sombras não lhe
suportarem as eternas fulgurações, já que não poderiam devolvê-lo ao Céu e nem
lhe desejavam a presença, junto delas, no chão, deram-se pressa em suspendê-lo
na cruz, para que se extinguisse, entre um e outro. Ele, no entanto, não se
agastou, de leve, e qual ocorre à semente que regressa da retorta escura a que
foi relegada, convertendo abandono em pão redivivo, Jesus também, ao terceiro
dia, contado sobre o desprezo extremo, voltou, em plenitude de amor, e ao
transformar sacrifício em luz renascente, retomou a construção da concórdia e
da fraternidade, na Terra, afirmando aos companheiros fracos e espantados:
- "A paz seja convosco."
Do
livro “OPINIÃO ESPÍRITA”
*OS
BONS ESPÍRITAS
4.
Bem compreendido, mas sobretudo bem sentido, o Espiritismo leva aos resultados
acima expostos, que caracterizam o verdadeiro espírita, como o cristão
verdadeiro, pois que um o mesmo é que outro. O Espiritismo não institui nenhuma
nova moral; apenas facilita aos homens a inteligência e a prática da do Cristo,
facultando fé inabalável e esclarecida aos que duvidam ou vacilam. Muitos,
entretanto, dos que acreditam nos fatos das manifestações não lhes apreendem as
consequências, nem o alcance moral, ou, se os apreendem, não os aplicam a si
mesmos. A que atribuir isso? A alguma falta de clareza da Doutrina? Não, pois
que ela não contém alegorias nem figuras que possam dar lugar a falsas
interpretações. A clareza é da sua essência mesma e é donde lhe vem toda a
força, porque a faz ir direito à inteligência. Nada tem de misteriosa e seus
iniciados não se acham de posse de qualquer segredo, oculto ao vulgo. Será
então necessária, para compreendê-la, uma inteligência fora do comum? Não,
tanto que há homens de notória capacidade que não a compreendem, ao passo que
inteligências vulgares, moços mesmo, apenas saídos da adolescência, lhes
apreendem, com admirável precisão, os mais delicados matizes. Provém isso de
que a parte por assim dizer material da ciência somente requer olhos que
observem, enquanto a parte essencial exige um certo grau de sensibilidade, a
que se pode chamar maturidade do senso moral, maturidade que independe da idade
e do grau de instrução, porque é peculiar ao desenvolvimento, em sentido
especial, do Espírito encarnado. Nalguns, ainda muito tenazes são os laços da
matéria para permitirem que o Espírito se desprenda das coisas da Terra; a
névoa que os envolve tira-lhes a visão do infinito, donde resulta não romperem
facilmente com os seus pendores, nem com seus hábitos, não percebendo haja
qualquer coisa melhor do que aquilo de que são dotados. Têm a crença nos Espíritos
como um simples fato, mas que nada ou bem pouco lhes modifica as tendências
instintivas. Numa palavra: não divisam mais do que um raio de luz, insuficiente
a guiá-los e a lhes facultar uma vigorosa aspiração, capaz de lhes sobrepujar
as inclinações. Atêm-se mais aos fenômenos do que à moral, que se lhes afigura
cediça e monótona. Pedem aos Espíritos que incessantemente os iniciem em novos
mistérios, sem procurar saber se já se tornaram dignos de penetrar os arcanos
do Criador. Esses são os espíritas imperfeitos, alguns dos quais ficam a meio
caminho ou se afastam de seus irmãos em crença, porque recuam ante a obrigação
de se reformarem, ou então guardam as suas simpatias para os que lhes
compartilham das fraquezas ou das prevenções. Contudo, a aceitação do princípio
da doutrina é um primeiro passo que lhes tornará mais fácil o segundo, noutra
existência. Aquele que pode ser, com razão, qualificado de espírita verdadeiro
e sincero, se acha em grau superior de adiantamento moral. O Espírito, que nele
domina de modo mais completo a matéria, dá-lhe uma percepção mais clara do futuro;
os princípios da Doutrina lhe fazem vibrar fibras que nos outros se conservam
inertes. Em suma: é tocado no coração, pelo que inabalável se lhe torna a fé.
Um é qual músico que alguns acordes bastam para comover, ao passo que outro
apenas ouve sons. Reconhece-se o verdadeiro espírita pela sua transformação
moral e pelos esforços que emprega para domar suas inclinações más. Enquanto um
se contenta com o seu horizonte limitado, outro, que apreende alguma coisa de
melhor, se esforça por desligar-se dele e sempre o consegue, se tem firme a
vontade.
O
EVANGELHO SEGUNDO O ESPIRITISMO - Cap. XVII - Item 4 – Allan Kardec
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