APRENDIZES
E ADVERSÁRIOS
Jonathan, Jessé e Eliakim,
funcionários do, Templo de Jerusalém, passando por Cafarnaum, procuraram Jesus
no singelo domicílio de Simão Pedro.
Recebidos pelo Senhor,
entregaram-se, de imediato, à conversação.
― Mestre ― disse o primeiro ―, soubemos que a
tua palavra traz ao mundo as Boas Novas do Reino de Deus e, entusiasmados com
as tuas concepções, hipotecamos ao teu ministério o nosso aplauso irrestrito.
Aspiramos, Senhor, à posição de discípulos teus...
Não obstante as obrigações que
nos prendem ao sagrado Tabernáculo de Israel, anelamos servir-te, aceitando-te
as idéias e lições, com as quais seremos colunas de tua causa na cidade eleita
do Povo Escolhido... Contudo, antes de solenizar nossos votos, desejamos
ouvir-te quanto à conduta que nos compete à frente dos inimigos...
― Messias, somos hostilizados por
terríveis desafetos, no Santuário ― exclamou o segundo ―, e, extasiados com os
teus ensinamentos, estimaríamos acolher-te a orientação.
― Filho de Deus ― pediu o
terceiro ―, ensina-nos como agir...
Jesus meditou alguns instantes, e
respondeu:
― Primeiramente, é justo
considerar nossos adversários como instrutores. O inimigo vê junto de nós a
sombra que o amigo não deseja ver e pode ajudar-nos a fazer mais luz no caminho
que nos é próprio. Cabe-nos, desse modo, tolerar-lhe as admoestações, com
nobreza e serenidade, tal qual o ferro, que após sofrer, paciente, o calor da
forja, ainda suporta os golpes do malho com dignidade humilde, a fim de se
adaptar à utilidade e à beleza.
Os visitantes entreolharam-se,
perplexos, e Jonathan retomou a palavra, perguntando:
― Senhor, e se somos injuriados?
― Adotemos o perdão e o silêncio
― disse Jesus. ― Muita gente que insulta é vítima de perturbação e enfermidade.
― E se formos perseguidos? ―
indagou Jessé.
― Utilizemos a oração em favor
daqueles que nos afligem, para que não venhamos a cair no escuro nível da
ignorância a que se acolhem.
― Mestre, e se nos baterem,
esmurrarem? ― interrogou Eliakim. ― que fazer se a violência nos avilta e confunde?
―Ainda assim ―esclareceu o brando
interpelado ―, a paz íntima deve ser nosso asilo e o amor fraterno a nossa
atitude, porquanto, quem procura seviciar o próximo e dilacerá-lo está louco e
merece compaixão.
― Senhor ― insistiu Jonathan ―,
que resposta oferecer, então, à maledicência, à calúnia e à perversidade?
O Cristo sorriu e precisou:
― O maledicente guarda consigo o
infortúnio de descer à condição do verme que se alimenta com o lixo do mundo, o
caluniador traz no coração largas doses de fel e veneno que lhe flagelam a
vida, e o perverso tem a infelicidade de cair nas armadilhas que tece para os
outros. O perdão é a única resposta que merecem, porque são bastante desditosos
por si mesmos.
― E que reação assumir perante os
que perseguem? ― inquiriu Jessé, preocupado.
― Quem persegue os semelhantes
tem o espírito em densas trevas e mais se assemelha ao cego desesperado que
investe contra os fantasmas da própria imaginação, arrojando-se ao fosso do
sofrimento.
Por esse motivo, o socorro
espiritual é o melhor remédio para os que nos atormentam...
― E que punição reservar aos que
nos ferem o corpo, assaltando-nos o brio? ― perguntou Eliakim espantado. ―
Refiro-me àqueles que nos vergastam a face e fazem sangrar o peito...
― Quem golpeia pela espada, pela
espada será golpeado também, até que reine o Amor Puro na Terra ― explicou o
Mestre, sem pestanejar. ― Quem se rende às sugestões do crime é um doente
perigoso que devemos corrigir com a reclusão e com o tratamento indispensável.
O sangue não apaga o sangue e o mal não retifica o mal...
E, espraiando o olhar doce e
lúcido pelos circunstantes, continuou:
― É imperioso saibamos amar e
educar os semelhantes com a força de nossas convicções e conhecimentos, a fim
de que o Reino de Deus se estenda no mundo... As Boas Novas de Salvação esperam
que o santo ampare o pecador, que o são ajude o enfermo, que a vítima auxilie o
verdugo...
Para isso, é imprescindível que o
perdão incondicional, com o olvido de todas as ofensas, assegure a paz e a
renovação de tudo...
Nesse ínterim, uma criança doente
chorou em alta voz num aposento contíguo.
O Mestre pediu alguns instantes
de espera e saiu para socorrê-la, ,as, ao regressar, debalde buscou a presença
dos aprendizes fervorosos e entusiastas.
Na sala modesta de Pedro não havia
ninguém.
IRMÃO X
Do livro Contos Desta e Doutra Vida
Psicografia de Francisco CÂNDIDO Xavier
Nenhum comentário:
Postar um comentário