sábado, 23 de julho de 2016


QUESTÃO DE ÉTICA
 
Sem a observância ativa e vigilante dos princípios éticos que o informam, nenhum movimento cultural pode subsistir, pois estará minado em suas bases pela irresponsabilidade dos adeptos. O que se evidenciou, no caso da adulteração, desta vez de maneira ameaçadora e até mesmo arrasadora, foi o estado de alienação em que caiu a comunidade espírita no tocante às suas responsabilidades doutrinárias. Este não é um problema superficial, que possamos simplesmente ignorar. É um problema da mais alta gravidade para todas as organizações humanas. O que a ética espírita nos ensina é que não devemos confundir o erro com quem o cometeu. Esse é um princípio superior de ética. Perdoamos o autor ou autores do erro, mas não podemos tolerar o erro. Este tem de ser corrigido. E os autores que não revelaram sensibilidade suficiente para se penitenciarem devem ser corrigidos, sob pena de estimularmos o erro e criarmos no meio doutrinário um clima de indignidade geral.
 
Chico Xavier deu-nos uma prova eloquente desse procedimento. Envolvido indebitamente no caso da adulteração, por haver sugerido uma modificação em tradução que lhe parecia embaraçosa, sentiu-se responsável pelo crime e assumiu de pronto a sua responsabilidade total. Logo mais passado o estado emocional que o confundira, ao tomar consciência da distância que havia entre a sua sugestão e a intenção dos adulteradores, voltou a público para condenar a desfiguração dos textos kardequianos e retificar a sua posição. Jamais ele podia ter pensado em admitir a adulteração, pois com isso negaria todo o seu passado de cerca de meio século de fidelidade e respeito absoluto a Kardec.
 
O exemplo da desfiguração do Cristianismo é suficiente para nos mostrar os perigos a que fomos expostos. Essa desfiguração foi tão profunda que levou as igrejas a transformarem Jesus em mito e promoverem perseguições e matanças vandálicas em nome do Mestre e de Deus. Não basta esse terrível exemplo histórico, essa catástrofe moral que redundou na expansão do ateísmo e do materialismo na Terra, para advertir os espíritas, que se colocam sob a égide do Espírito da Verdade, quanto ao perigo da frouxidão moral no campo doutrinário? Queremos, por comodismo e em nome de interesses imediatistas, deixar que a irresponsabilidade deturpe também o Cristianismo Redivivo que o Espiritismo nos traz, mergulhando novamente a Terra em milênios de trevas? Se não lutarmos pela intangibilidade e a pureza da Doutrina, o que é que desejamos divulgar, oferecer, ensinar aos outros, pessoalmente e através de nossas instituições? As nossas ideias imprecisas e muitas vezes absurdas, as nossas pretensões orgulhosas, a pseudo sabedoria da nossa vaidade, as nossas lamentáveis deficiências em todos os sentidos?
 
NA HORA DO TESTEMUNHO
Francisco Candido Xavier e J. Herculano Pires

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