Amor e renúncia - Pedro quis saber por que em Caná Jesus
transformara a água em vinho, já que este poderia cooperar para o
desenvolvimento da embriaguez e da gula. “Simão -- disse o Mestre --, conheces
a alegria de servir a um amigo? As bodas de Caná foram um símbolo da nossa
união na Terra. O vinho, ali, foi bem o da alegria com que desejo selar a
existência do Reino de Deus nos corações. Estou com os meus amigos e amo-os a
todos. Os afetos dalma, Simão, são laços misteriosos que nos conduzem a Deus.
Saibamos santificar a nossa afeição, proporcionando aos nossos amigos o máximo
da alegria; seja o nosso coração uma sala iluminada onde eles se sintam
tranqüilos e ditosos.” E aduziu: “As mais belas horas da vida são as que empregamos
em amá-los, enriquecendo-lhes as satisfações íntimas”. (PP. 81 e 82)
72.
Pedro indagou então: “E quando os amigos não nos entendam, ou quando nos
retribuam com ingratidão?” O Mestre respondeu-lhe asseverando que o amor
verdadeiro e sincero nunca espera recompensas: “A renúncia é o seu ponto de
apoio, como o ato de dar é a essência de sua vida. A capacidade de sentir
grandes afeições já é em si mesma um tesouro. A compreensão de um amigo deve
ser para nós a maior recompensa. Todavia, quando a luz do entendimento tardar
no espírito daqueles a quem amamos, deveremos lembrar-nos de que temos a
sagrada compreensão de Deus, que nos conhece os propósitos mais puros”. “Ainda
que todos os nossos amigos do mundo se convertessem, um dia, em nossos
adversários, ou mesmo em nossos algozes, jamais nos poderiam privar da alegria
infinita de lhes haver dado alguma coisa!...” (P. 82)
73.
Um dia, Jesus deu a perceber que os homens que não estivessem decididos a
colocar o Reino de Deus acima da família não podiam ser seus discípulos. Pedro
estranhou tais palavras e perguntou-lhe: Como conciliar essa postura com as
anteriores observações que ele fizera acerca dos laços sagrados entre os que se
estimam? “Simão -- asseverou o Cristo --, a minha palavra não determina que o
homem quebre os elos santos de sua vida; antes exalta os que tiverem a
verdadeira fé para colocar o poder de Deus acima de todas as coisas e de todos
os seres da criação infinita.” Ato contínuo, completou: “Tenho dado aos meus
discípulos o título de amigos, por ser o maior de todos. O Evangelho não pode condenar os laços de
família, mas coloca acima deles o laço indestrutível da paternidade de Deus. O
Reino do Céu no coração deve ser o tema central de nossa vida. Tudo mais é
acessório”. (PP. 83 e 84)
74.
Jesus esclareceu que a família, no mundo, está igualmente subordinada aos
imperativos dessa edificação. Todos os homens sabem conservar, mas raros sabem
privar-se. Na construção do Reino de Deus, chega um instante de separação, que
é preciso suportar com sincero desprendimento. A edificação do Reino do Céu no
coração dos homens deve constituir a preocupação primeira, a aspiração mais
nobre da alma, as esperanças centrais do espírito. (P. 84)
Boa Nova
Humberto
de Campos, psicografia de Francisco Cândido Xavier.
Editora da FEB, 11a edição, 1941.
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